Certo dia, chegou às ruas de Kinze um jovem padre, sedento pelo conhecimento escatológico que nem seu médico, nem seu bispo lhe ofereciam. Ele buscava por respostas sobre o Céu e o Inferno, e sabia que naquela cidade, naquelas ruas, perambulava um grande sábio.
Seguindo o rastro das barbas falhas do sábio, o jovem padre o encontrou, em uma taverna, bebendo o mais puro Steinhäger da região.
- És tu o grande sábio destas terras? -, pergunta o padre.
- Sim, sou eu, Midei Shempaz! -, responde ebriamente o sábio.
- Desculpe-me!
- Não, este é meu nome!
- Ah... Preciso saber de ti, ó sábio, qual a diferença entre o Céu e o Inferno?
- Vejo que você é padre. É, a Igreja é pouco prática nesses assuntos. Mas vamos lá, meu filho: imagine o Céu e o Inferno como duas festas de casamento. O Céu é o casamento de pobre: bêbados, cerveja barata, vinho barato, mulheres com vestidos horríveis, carne dura, briga. O Inferno é o casamento de rico: restaurante chique, champanhe, comida coisa fina, mulheres com vestidos de grife e siliconadas (algumas gostosas), alguns debates em conversas de cavalheiros e damas.
- Não entendo: dessa forma, parece que o Inferno é melhor que o Céu. -, respondeu, confuso, o padre.
- Parece mas não é, não, meu querido. No casamento de pobre, tudo se extravasa ali, a alma está na ponta da língua, na ponta dos dedos e no bafo de cerveja; o que se levam são os salgadinhos, dentro da bolsa, símbolos da experiência redentora. Isso, mesmo com bafo, é o Céu. No casamento de rico, tudo é aparência, é Photoshop, depois um fica maldizendo o outro, pelas costas; leva-se, dali, a luxúria e um suvenir, símbolo da experiência maldita. Ah, isso é um Inferno!
Ouvindo isto, o jovem se desfez de seu colarinho de padre, deixando de sentir a angústia sufocante da ignorância.