terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Dia sem fim (parte XI)

Fausto, o homem que vendeu a alma a Mefistófeles em troca de dinheiro e poder. Ele mataria se assim fosse vontade do “Mephisto”. Pois era primeiro o ser demoníaco que devíamos procurar.

“Sua idéia é muito arriscada, professor.”, disse Irina, que continuou: “por mais que seja o Mefistófeles de um livro, ele pode se imaginar não do mundo dos sonhos, mas do próprio inferno.” Do inferno? Então céu e inferno não são imaginação?

“Será que vai dar certo?”, perguntou Sarah. Ninguém acreditava que esse plano maluco funcionaria: invocar o diabo e fazê-lo convencer seu “sócio”, Fausto, a nos matar. “E por que precisamos morrer?”, perguntei já saudoso de meu sangue. “Porque assim recuperamos o equilíbrio, como numa balança: o lado mais leve precisa se equiparar com o mais pesado.”, resolveu Wellington.

E lá fomos: “Mefistófeles, Senhor de Fausto, vinde até nós!”, repetindo a ladainha satânica para um ato santo! “Mefistófeles, Senhor de Fausto, vinde até nós!”, até que o céu roxo escureceu-se, como que sem luz nem mesmo da lua ou das estrelas, e apareceu em nossa frente um homem com roupas de gala e fogo nos olhos.

Antes que um de nós pudesse explicar a rogação, Mefistófeles disse: “Eu já sei o que vocês querem. Mas não terão! EU não convencerei Fausto a matá-los! Seu mundo se destruirá, porque EU quis assim! EU sou Imperador do Mundo! Vocês sucumbirão à eternidade do nada, junto com seu mundo de sonhos, porque EU terei prazer em plenitude depois de ver a agonia da destruição de seus lares! EU, Senhor da Trapaça, EU os matarei!”

Uma dor profunda acompanhava o que parecia ser rasgar de ossos nas costelas, além de uma sensação de derretimento do cérebro. Eu, Irina, Wellington e Sarah, agonizando as dores da morte. Era o fim de tudo. Se aquele Mefistófeles fosse um demônio “real”, morreríamos e os dois mundos entrariam em destruição mútua. Mas, se aquele fosse o Mefistófeles do Goethe, o equilíbrio estaria feito e nossas mortes não seriam em vão.

Entre os gritos de desespero e dor, ouvi a voz de Irina, quase num gemido: “perdão, professor! Eu errei!”. Um pedido indevido, já que a idéia frustrada foi minha. Depois de ver os olhos pretos e molhados de Irina se fecharem, caí em escuridão.

Eu já não ouvia mais os gritos. Não sentia o fogo derretendo as entranhas. Um silêncio total, mergulhado em escuridão profunda, num instante onde eu não sabia se era eternidade ou fim do tempo. Eu estava sozinho, sem nada, sem ninguém. Falhamos: eis o fim de tudo.

De repente, de forma violenta, as trevas foram quebradas por um longo assovio e voltei a sentir minhas costelas, que pareciam golpear o nada. O assovio perturbador continuava e, de quando em quando, minhas costelas pulavam do chão como se fossem puxadas por uma força alheia até que o assovio cessou.

“Conseguimos trazê-lo de volta! O coração voltou a bater!”, diziam vozes em volta de mim. Com muito esforço, consegui abrir os olhos: eu estava na cama de um hospital, ligado a aparelhos. “Que susto você nos deu, professor!”, disse um dos médicos. Eu havia passado por um infarto no coração na noite de domingo. Fui salvo por um dos parentes da visita dominical. Eu só veria Irina uma semana depois.

Durante os dias de internamento, ficava pensando se tudo aquilo era sonho. Talvez uma forma que o cérebro arrumou para manter a vida nesse corpo moribundo. Eu ficava esperando a visita de um dos envolvidos nesse sonho, mas: nada.

No quarto dia recebi, então, a visita de minha filha. Ela olhava com felicidade e alívio para meu rosto de barba por fazer. Depois de um longo abraço e um beijo na testa, a menina mirou no meu olhar com seus olhos pretos e, novamente, adivinhou minha indagação: “sim, pai: tudo o que aconteceu foi verdade. Agora não é mais. Agora o mundo dos sonhos segue seu rumo, enquanto nós vivemos no mundo físico. O que aconteceu foi real, mas não é mais porque evitamos aquela catástrofe. Mefistófeles tanto se imaginava senhor dos infernos que acreditava ser real e, por isso, queria que tudo se destruísse. Nós quatro sabemos disso, mais ninguém. Agora, o nosso dever é fazer renascer os sonhos na mente das pessoas.”

FIM

Um comentário:

  1. Viagem total...Sensacional! sentirei saudades... (tipo saudade de seriado bom sabe?)

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