Não sentia tanto nojo perante uma cena de entretenimento desde o jogo Postal e o filme Cidade de Deus.
Refiro-me à já famosa cena no Aeroporto de Moscou, no jogo Call of Duty: Modern Warfare 2. Não sou moralista, não sou contra jogos violentos (os quais também jogo, como GTA, Assassin's Creed e Mortal Kombat). Mesmo assim, o realismo desta peça de ficção, de jogo, na franca matança de pessoas inocentes, a missão incabida enfiada entre as outras missões de forma aparentemente tendenciosa, causou-me asco.
Não colocarei o vídeo da cena aqui. E o link que postarei provavelmente será tirado do ar, por uma caça da própria produtora do jogo, Activision, por cenas do jogo postadas indevidamente. Então, para quem não viu, avalie por si mesmo: http://www.youtube.com/watch?v=vxdZyGGE3T8
O título da missão é "no russian" que, traduzido livremente, pode significar "sem russos" ou "não aos russos".
segunda-feira, 28 de dezembro de 2009
sexta-feira, 25 de dezembro de 2009
Carta aberta a Papai Noel
Papai Noel: não acredito em você. Sei que você não existe. Por isso, Papai Noel, vou confidenciar o que espero do futuro.
Espero que o natal seja, a partir de agora, uma data sem presentes e sem festas. Pois até hoje, entre sorrisos malditos e hipocrisia generalizada, o único gesto sincero que vi de uma pessoa com alguém alheio a ela partiu de um mendigo bêbado. E isso foi em maio.
Espero que, no fim de ano, as famílias se preocupem em arrumar bastantes poltronas, cadeiras, sofás e bancos dispostos em roda, para que todos converesm, ouçam o que os mais velhos tem a dizer, cantem, toquem instrumentos musicais, dancem, façam jogos de tabuleiro.
Espero que o Parlamento norueguês conceda o Prêmio Nobel da Paz à Pastoral da Criança, e não ao novíssimo Senhor da Guerra que enganou um mundo todo.
Espero que o cidadão brasileiro revoltado com a impunidade aos políticos corruptos - o que já é quase uma redundância - perceba que ele mesmo, quando usa de seus "jeitinhos" para se prevalecer, é tão corrupto quanto o ministro do Supremo (supremo???), o governador, o senador...
Espero que as agulhas do diabo não perfurem mais o corpo de crianças. Meu desejo macabro é que elas se voltassem aos olhos de seus feiticeiros.
Espero que celebridades mortas não voltem à vida. Acho que elas não gostariam de ver o que suas famílias fizeram...
Espero que as religiões sejam apenas instrumentos de vida em comunidade, de ritual e de mística, tão importantes à cultura e ao indivíduo. Espero, sinceramente, que elas deixem de ser o ópio do povo. Assim, religiosos que drogam as pessoas para ganhar dinheiro vão queimar no inferno do esquecimento.
Espero, Papai Noel, que ninguém mais acredite em você. Ou, se for para acreditar, que seja na imagem mística de um senhor preocupado com as aflições de crianças e adultos, e não de um velho cinematográfico-estadunidense preocupado em entregar o último videogame na confortável casa de um menino branco em Cleveland.
Mas sei, Papai Noel, que você não me ouve. Não acredito em você. Sei que você não existe. Não acredito em você da mesma forma que acredito em Deus: inexplicavelmente. E, por acreditar em Deus assim, tenho esperança. Por isso, sabendo que Papai Noel não existe, espero junto com você por este futuro. Espero.
Espero que o natal seja, a partir de agora, uma data sem presentes e sem festas. Pois até hoje, entre sorrisos malditos e hipocrisia generalizada, o único gesto sincero que vi de uma pessoa com alguém alheio a ela partiu de um mendigo bêbado. E isso foi em maio.
Espero que, no fim de ano, as famílias se preocupem em arrumar bastantes poltronas, cadeiras, sofás e bancos dispostos em roda, para que todos converesm, ouçam o que os mais velhos tem a dizer, cantem, toquem instrumentos musicais, dancem, façam jogos de tabuleiro.
Espero que o Parlamento norueguês conceda o Prêmio Nobel da Paz à Pastoral da Criança, e não ao novíssimo Senhor da Guerra que enganou um mundo todo.
Espero que o cidadão brasileiro revoltado com a impunidade aos políticos corruptos - o que já é quase uma redundância - perceba que ele mesmo, quando usa de seus "jeitinhos" para se prevalecer, é tão corrupto quanto o ministro do Supremo (supremo???), o governador, o senador...
Espero que as agulhas do diabo não perfurem mais o corpo de crianças. Meu desejo macabro é que elas se voltassem aos olhos de seus feiticeiros.
Espero que celebridades mortas não voltem à vida. Acho que elas não gostariam de ver o que suas famílias fizeram...
Espero que as religiões sejam apenas instrumentos de vida em comunidade, de ritual e de mística, tão importantes à cultura e ao indivíduo. Espero, sinceramente, que elas deixem de ser o ópio do povo. Assim, religiosos que drogam as pessoas para ganhar dinheiro vão queimar no inferno do esquecimento.
Espero, Papai Noel, que ninguém mais acredite em você. Ou, se for para acreditar, que seja na imagem mística de um senhor preocupado com as aflições de crianças e adultos, e não de um velho cinematográfico-estadunidense preocupado em entregar o último videogame na confortável casa de um menino branco em Cleveland.
Mas sei, Papai Noel, que você não me ouve. Não acredito em você. Sei que você não existe. Não acredito em você da mesma forma que acredito em Deus: inexplicavelmente. E, por acreditar em Deus assim, tenho esperança. Por isso, sabendo que Papai Noel não existe, espero junto com você por este futuro. Espero.
segunda-feira, 21 de dezembro de 2009
O menino verde
Era uma vez um menino verde. Nasceu verde, cresceu verde. Sua mãe o vestia com roupas sempre combinando com o verde claro de sua pele.
O menino verde era muito esperto. Aprendeu tudo muito rápido, mas não queria ir à escola – que tinha as paredes verdes. Lá ele não era o filho de seus pais, o esperto, o bonitinho: era apenas um menino verde, personagem principal das piadas e maldades de seus colegas. Lá, até a professora ria de sua verdejante realidade. Lá ele aprendeu que as pessoas mais velhas se apaixonam: isso foi ao conhecer uma menina marrom, tão linda!
O menino verde foi crescendo. Chegou a adolescência, as maldades dos colegas cruéis se intensificaram; o amor dos pais sempre mais forte; os professores a tratá-lo como uma aberração; a menina marrom, ainda mais linda... Escola, universidade, formatura, trabalho...
O menino verde cresceu. Agora é homem, trabalhador bem sucedido. Mas um homem isolado, verde; deixou de viver as dores e os amores. Tinha medo das cores do mundo que o excluía por ser verde. A imagem da menina marrom ainda vivia em sua memória. Até o dia em que a menina marrom apareceu à sua frente, trazendo uma explosão de pulmões e coração acompanhados de um filme que contava toda sua vida de sofrimento verde em segundos. Os dois se abraçaram, contaram sobre suas vidas até ali. A menina – agora mulher – marrom ouviu do menino – agora homem – verde uma confissão de seus mais profundos sentimentos, privilégio que só os pais do rapaz haviam conquistado. Depois, a moça também revelou-se.
Ele não sabia que também riam da menina marrom. Ele não sabia que ela também tinha medo das cores de um mundo que a excluía por ser marrom. Ele não sabia que a mãe da menina marrom foi agredida na rua, simplesmente por ser marrom. E eles, até ali, não tinham percebido que o amor dos dois seria a vitória de todas as cores – verde, marrom, lilás, flicts – sobre as falsas cores do mundo de aparências podres.
O menino verde era muito esperto. Aprendeu tudo muito rápido, mas não queria ir à escola – que tinha as paredes verdes. Lá ele não era o filho de seus pais, o esperto, o bonitinho: era apenas um menino verde, personagem principal das piadas e maldades de seus colegas. Lá, até a professora ria de sua verdejante realidade. Lá ele aprendeu que as pessoas mais velhas se apaixonam: isso foi ao conhecer uma menina marrom, tão linda!
O menino verde foi crescendo. Chegou a adolescência, as maldades dos colegas cruéis se intensificaram; o amor dos pais sempre mais forte; os professores a tratá-lo como uma aberração; a menina marrom, ainda mais linda... Escola, universidade, formatura, trabalho...
O menino verde cresceu. Agora é homem, trabalhador bem sucedido. Mas um homem isolado, verde; deixou de viver as dores e os amores. Tinha medo das cores do mundo que o excluía por ser verde. A imagem da menina marrom ainda vivia em sua memória. Até o dia em que a menina marrom apareceu à sua frente, trazendo uma explosão de pulmões e coração acompanhados de um filme que contava toda sua vida de sofrimento verde em segundos. Os dois se abraçaram, contaram sobre suas vidas até ali. A menina – agora mulher – marrom ouviu do menino – agora homem – verde uma confissão de seus mais profundos sentimentos, privilégio que só os pais do rapaz haviam conquistado. Depois, a moça também revelou-se.
Ele não sabia que também riam da menina marrom. Ele não sabia que ela também tinha medo das cores de um mundo que a excluía por ser marrom. Ele não sabia que a mãe da menina marrom foi agredida na rua, simplesmente por ser marrom. E eles, até ali, não tinham percebido que o amor dos dois seria a vitória de todas as cores – verde, marrom, lilás, flicts – sobre as falsas cores do mundo de aparências podres.
quarta-feira, 16 de dezembro de 2009
Tirania da não-cultura e do não-saber
Francisco Franco,
Benito Mussolini,
Adolf Hitler,
Joseph Stálin,
Vladimir Lênin,
Pol Pot,
Getúlio Vargas,
Ernesto Geisel,
Hugo Chávez,
Microsoft,
Google,
pulseiras.
Benito Mussolini,
Adolf Hitler,
Joseph Stálin,
Vladimir Lênin,
Pol Pot,
Getúlio Vargas,
Ernesto Geisel,
Hugo Chávez,
Microsoft,
Google,
pulseiras.
Fábio Pedro Racoski
sábado, 12 de dezembro de 2009
A dezena do terço
Já não tenho fé o bastante.
Não sei se fé é o bastante.
A cera da vela queima,
os painossos seguem
as avemarias,
e tudo fede a pavio
e desespero.
Já não tenho fé o bastante.
Não sei se sou ignorante
em assuntos de Deus.
Não sei se sou ignorante
em assuntos ateus.
Sei que a dúvida
é minha constante.
Já não tenho fé o bastante.
E isso não me é apavorante.
Jesus não me ouve
aos gritos,
nem aos sussurros,
suplicando favores divinos.
Já não tenho fé o bastante
mas sigo confiante:
se Deus quer boas gentes,
é consequência querer
gentes pensantes,
ainda que de outro partido.
Já não tenho fé o bastante
ou tenho, não sei, quem sabe?
Não sei se fé é o bastante.
A cera da vela queima,
os painossos seguem
as avemarias,
e tudo fede a pavio
e desespero.
Já não tenho fé o bastante.
Não sei se sou ignorante
em assuntos de Deus.
Não sei se sou ignorante
em assuntos ateus.
Sei que a dúvida
é minha constante.
Já não tenho fé o bastante.
E isso não me é apavorante.
Jesus não me ouve
aos gritos,
nem aos sussurros,
suplicando favores divinos.
Já não tenho fé o bastante
mas sigo confiante:
se Deus quer boas gentes,
é consequência querer
gentes pensantes,
ainda que de outro partido.
Já não tenho fé o bastante
ou tenho, não sei, quem sabe?
Fábio Pedro Racoski
quinta-feira, 10 de dezembro de 2009
O estado da União
se no Rio
Paraíba é xingamento
e em São Paulo
baiano é ofensa
lanço um neologismo
na terra dos pinheirais:
agora, em Curitiba,
paulista-carioca
é palavrão imperdoável.
Paraíba é xingamento
e em São Paulo
baiano é ofensa
lanço um neologismo
na terra dos pinheirais:
agora, em Curitiba,
paulista-carioca
é palavrão imperdoável.
Fábio Pedro Racoski
sábado, 5 de dezembro de 2009
À minha mãe
Deixei agendada esta postagem.
Ontem, dia 04/12, minha mãe, Maria de Lourdes Purkott, completou 60 anos de vida. Hoje, exatamente a esta hora, fizemos uma festa surpresa à Dona Lourdes, onde estão presentes familiares, amigos e "filhos agregados" que ela colheu nesses anos.
Desde 1993, com a morte do meu pai, Gerson, minha mãe passou a ser também o pai da família. Não apenas isso, mas a nossa fortaleza, ainda que sofresse um doloroso golpe do destino com a perda de sua filha mais velha - minha irmã -, Mônica, em 1998.
Se superamos as dores das perdas, se hoje eu sou professor e minha irmã é pedagoga - e também professora -, se nós somos uma famíla com muito humor, não há outro responsável senão a Dona Lourdes. Por isso, caro leitor e querida leitora, peço um momento de sua atenção para este poema composto a ela.
Fortaleza e aconchego
Mãe.
Palavra sem rimas.
Nenhuma outra palavra
ousa rimar com ela.
Nem por isso está sozinha.
Mãe.
O verso se fez carne,
a lágrima se fez alegria,
a dor se fez orgulho,
o medo se fez coragem.
Mãe.
A curandeira das chagas,
a psicóloga da rebeldia,
o pai da ausência,
o eterno colo.
Mãe.
Mais forte, mais bela,
mais suor, mais voz,
mais preocupação,
mais empenho.
Mãe.
Tu, mãe, que carregas
filhos além dos teus.
Tu, que levas
as dores das perdas
e as alegrias das conquistas.
Conquistas
mais tuas que nossas.
Tu, mãe, que és mãe
de toda uma geração,
saibas que estes versos
não levarão as lágrimas
de todos os bons sentimentos
que derramo ao compô-los.
Mas espero que levem
uma melodia do amor
que nós, teus filhos,
temos por ti.
Ontem, dia 04/12, minha mãe, Maria de Lourdes Purkott, completou 60 anos de vida. Hoje, exatamente a esta hora, fizemos uma festa surpresa à Dona Lourdes, onde estão presentes familiares, amigos e "filhos agregados" que ela colheu nesses anos.
Desde 1993, com a morte do meu pai, Gerson, minha mãe passou a ser também o pai da família. Não apenas isso, mas a nossa fortaleza, ainda que sofresse um doloroso golpe do destino com a perda de sua filha mais velha - minha irmã -, Mônica, em 1998.
Se superamos as dores das perdas, se hoje eu sou professor e minha irmã é pedagoga - e também professora -, se nós somos uma famíla com muito humor, não há outro responsável senão a Dona Lourdes. Por isso, caro leitor e querida leitora, peço um momento de sua atenção para este poema composto a ela.
Fortaleza e aconchego
Mãe.
Palavra sem rimas.
Nenhuma outra palavra
ousa rimar com ela.
Nem por isso está sozinha.
Mãe.
O verso se fez carne,
a lágrima se fez alegria,
a dor se fez orgulho,
o medo se fez coragem.
Mãe.
A curandeira das chagas,
a psicóloga da rebeldia,
o pai da ausência,
o eterno colo.
Mãe.
Mais forte, mais bela,
mais suor, mais voz,
mais preocupação,
mais empenho.
Mãe.
Tu, mãe, que carregas
filhos além dos teus.
Tu, que levas
as dores das perdas
e as alegrias das conquistas.
Conquistas
mais tuas que nossas.
Tu, mãe, que és mãe
de toda uma geração,
saibas que estes versos
não levarão as lágrimas
de todos os bons sentimentos
que derramo ao compô-los.
Mas espero que levem
uma melodia do amor
que nós, teus filhos,
temos por ti.
Fábio Pedro Racoski
terça-feira, 1 de dezembro de 2009
Ти гарячий і холодний
Direto da Ucrânia, uma homenagem a Katy Perry: "Hot 'n' cold", com "Los Colorados".
Aos passantes
A você, passante, que fica me medindo quando me vê.
A você, que se espanta
- como se visse um extraterrestre -
com meu corpo,
ou com meus cabelos,
ou com meu jeito estabanado,
ou com minha voz alta e estridente,
ou com o conjunto da obra.
A você, que me olha e pensa no absurdo que é
uma pessoa como eu trabalhar,
cantar, tocar flauta,
fazer poesia.
A você, passante, que acredita na ausência
de paixões, amores, ódios e vaidades em mim.
A você, querido e odiado desconhecido,
desejo uma vida melhor.
Uma vida menos triste e frustrante.
Onde você não precisa
fingir que é feliz
ao tentar se divertir
quando me vê.
A você, que se espanta
- como se visse um extraterrestre -
com meu corpo,
ou com meus cabelos,
ou com meu jeito estabanado,
ou com minha voz alta e estridente,
ou com o conjunto da obra.
A você, que me olha e pensa no absurdo que é
uma pessoa como eu trabalhar,
cantar, tocar flauta,
fazer poesia.
A você, passante, que acredita na ausência
de paixões, amores, ódios e vaidades em mim.
A você, querido e odiado desconhecido,
desejo uma vida melhor.
Uma vida menos triste e frustrante.
Onde você não precisa
fingir que é feliz
ao tentar se divertir
quando me vê.
Fábio Pedro Racoski
Camisa de força de Vênus
use camisinha
você precisa usá-la
mais que um direito
é um dever
faça sexo aos dez anos
mas use camisinha
pratique zoofilia
mas use camisinha
vá a uma sessão de necrofilia
mas use camisinha
estupre-se
mas use camisinha
faça programa com menores
mas use camisinha
rasgue-se
mas use camisinha
mostre-se pornograficamente
mas use camisinha
prostitue o país aos gringos
mas use camisinha
fale merda na tv
mas use camisinha
seja objeto
mas use camisinha
violente
mas use camisinha
use facas
mas use camisinha
por fim, ejacule
sua massa encefálica
mas use camisinha
para não contaminar
o parceiro
com seu cérebro.
você precisa usá-la
mais que um direito
é um dever
faça sexo aos dez anos
mas use camisinha
pratique zoofilia
mas use camisinha
vá a uma sessão de necrofilia
mas use camisinha
estupre-se
mas use camisinha
faça programa com menores
mas use camisinha
rasgue-se
mas use camisinha
mostre-se pornograficamente
mas use camisinha
prostitue o país aos gringos
mas use camisinha
fale merda na tv
mas use camisinha
seja objeto
mas use camisinha
violente
mas use camisinha
use facas
mas use camisinha
por fim, ejacule
sua massa encefálica
mas use camisinha
para não contaminar
o parceiro
com seu cérebro.
Fábio Pedro Racoski
segunda-feira, 30 de novembro de 2009
Um fado
Em resposta ao pedido do Igor Ravasco, eis aqui um fado que vale o mundo: "Há uma música do povo", poema de Fernando Pessoa cantado pela divinal Mariza.
domingo, 29 de novembro de 2009
Valores econômicos
O PIB da Califórnia
é um Brasil.
O PIB de São Paulo
é uma Argentina.
E o fado português
é um mundo inteiro.
é um Brasil.
O PIB de São Paulo
é uma Argentina.
E o fado português
é um mundo inteiro.
Fábio Pedro Racoski
terça-feira, 24 de novembro de 2009
Verborragia sem
eu
quero dizer
aquilo tudo
que não disse
quando não devia
nem deveria
dizer
o que não sei
porque sei
eu
só quero dizer
porque preciso
vomitar
preciso
procriar.
quero dizer
aquilo tudo
que não disse
quando não devia
nem deveria
dizer
o que não sei
porque sei
eu
só quero dizer
porque preciso
vomitar
preciso
procriar.
Fábio Pedro Racoski
quinta-feira, 19 de novembro de 2009
Não quero mais
não quero mais
adoecer
adolescer
aborrecer
emburrecer
emputecer
não devolver
envelhecer
evanescer
não renascer
um nada ser.
adoecer
adolescer
aborrecer
emburrecer
emputecer
não devolver
envelhecer
evanescer
não renascer
um nada ser.
Fábio Pedro Racoski
segunda-feira, 16 de novembro de 2009
sexta-feira, 13 de novembro de 2009
Difícil vida fácil
na segunda
moribunda
dói a bunda
tá corcunda
nauseabunda
infecunda
e se inunda
tão profunda
aprofunda
sua funda
via imunda
iracunda
vagabunda
moribunda
dói a bunda
tá corcunda
nauseabunda
infecunda
e se inunda
tão profunda
aprofunda
sua funda
via imunda
iracunda
vagabunda
Fábio Pedro Racoski
Não-ser humano
Já não sou
quem gostaria de ser
e nem sou
eu mesmo
que já fui.
Simplesmente
não sou.
Simplesmente
deixei-me
ser conquistado
pelo comodismo,
pelo conformismo,
pela preguiça,
pela mesmice.
Não sou.
E o fato de não ser
não me dói.
Já que, não sendo,
não sinto.
Por mais que
lágrimas secas
caiam dos meus olhos.
Não sou.
E não estou.
Por mais que você
sinta-me presente.
Por mais que eu
queira mostrar
o contrário.
Não sei.
Não falo a verdade.
Se há alguma certeza
em mim,
é que sou pura mentira.
Sou um blefador.
Um enganador.
Não vivo.
Não sou, não respiro, não amo,
apenas sou movido
pela inércia.
Olhe nos meus olhos:
eles estão vazios.
quem gostaria de ser
e nem sou
eu mesmo
que já fui.
Simplesmente
não sou.
Simplesmente
deixei-me
ser conquistado
pelo comodismo,
pelo conformismo,
pela preguiça,
pela mesmice.
Não sou.
E o fato de não ser
não me dói.
Já que, não sendo,
não sinto.
Por mais que
lágrimas secas
caiam dos meus olhos.
Não sou.
E não estou.
Por mais que você
sinta-me presente.
Por mais que eu
queira mostrar
o contrário.
Não sei.
Não falo a verdade.
Se há alguma certeza
em mim,
é que sou pura mentira.
Sou um blefador.
Um enganador.
Não vivo.
Não sou, não respiro, não amo,
apenas sou movido
pela inércia.
Olhe nos meus olhos:
eles estão vazios.
Fábio Pedro Racoski
quinta-feira, 12 de novembro de 2009
O exílio de Midei Shempaz (parte I)
Certo dia, depois de ser perseguido pela Associação das Senhoras Cristãs em Defesa da Retidão e da Moral, o grande sábio Midei Shempaz resolveu não comprar briga e exilou-se da sua terra de todos os dias e madrugadas, o Curitestão.
Ao ultrapassar as fronteiras curitãs, Midei Shempaz deixou todo um povo – exceto a Associação das Senhoras Cristãs em Defesa da Retidão e da Moral – chorando de saudade prévia. Midei Shempaz também chorava. Mesmo sendo sábio, não entendia por que as Senhoras Cristãs em Defesa da Retidão e da Moral o condenavam; afinal, beber Steinhäger todos os dias era como uma sicuta renovadora que libertava seu Sócrates interior dos malditos sofistas.
Depois de muito andar, já distante da fronteira, Midei Shempaz sentou numa cadeira de bar, tirou sua sanfona de 48 baixos da capa e começou a cantarolar a sua canção do exílio. Era assim a sofrida cantiga:
Os grandes sábios sempre são incompreendidos. Mais um chope!
Ao ultrapassar as fronteiras curitãs, Midei Shempaz deixou todo um povo – exceto a Associação das Senhoras Cristãs em Defesa da Retidão e da Moral – chorando de saudade prévia. Midei Shempaz também chorava. Mesmo sendo sábio, não entendia por que as Senhoras Cristãs em Defesa da Retidão e da Moral o condenavam; afinal, beber Steinhäger todos os dias era como uma sicuta renovadora que libertava seu Sócrates interior dos malditos sofistas.
Depois de muito andar, já distante da fronteira, Midei Shempaz sentou numa cadeira de bar, tirou sua sanfona de 48 baixos da capa e começou a cantarolar a sua canção do exílio. Era assim a sofrida cantiga:
Ai, minha terra que não vejo!
O silêncio moribundo
nesse peito vagabundo
tem a volta por desejo!
Ai, minha terra que não ouço!
Por viver de vadiar
querem me trancafiar,
me jogar num calabouço.
Ai, minha terra que não sinto!
Tua terra vou perdendo
por essas velhas querendo
me enforcar, cortar meus dedos.
Ai, minha terra, estou entregue!
Bebo muito e falo pouco
porque já estou todo rouco
de saudade do Steinhäger.
O silêncio moribundo
nesse peito vagabundo
tem a volta por desejo!
Ai, minha terra que não ouço!
Por viver de vadiar
querem me trancafiar,
me jogar num calabouço.
Ai, minha terra que não sinto!
Tua terra vou perdendo
por essas velhas querendo
me enforcar, cortar meus dedos.
Ai, minha terra, estou entregue!
Bebo muito e falo pouco
porque já estou todo rouco
de saudade do Steinhäger.
Os grandes sábios sempre são incompreendidos. Mais um chope!
quarta-feira, 11 de novembro de 2009
O pequeno massacre da vagina delicada
Hoje deparei-me com um arquivo (de computador mesmo!) datado de 7 de maio de 2003. É a imagem escaneada da divulgação de uma HQ. Fiz isso para uma - na época - nova amiga: segundo período da faculdade, e não fazia ideia de que a Barbara viria a ser uma amiga, no sentido mais eterno da palavra: para sempre, em qualquer lugar.
Mesmo trazendo uma grande dose de humor, essa imagem escaneada me traz alegria, nostalgia - da época em que estudávamos todos juntos -, singeleza.
Ah, os amigos (saudade)... Estaria mais morto sem eles!
Mesmo trazendo uma grande dose de humor, essa imagem escaneada me traz alegria, nostalgia - da época em que estudávamos todos juntos -, singeleza.
Ah, os amigos (saudade)... Estaria mais morto sem eles!
quarta-feira, 4 de novembro de 2009
Curitiba 34 graus
Ah, Curitiba, cidade
que me traz tanta saudade.
Chega o maldito verão
e me traz sofreguidão.
O frio invernal se vai,
e, em seu lugar magistral,
o atômico tropical
calor queima, me subtrai.
Idílica Era do Gelo:
regressa, vem congelar
esse mundo tão solar!
Aquele frio... Quero tê-lo...
que me traz tanta saudade.
Chega o maldito verão
e me traz sofreguidão.
O frio invernal se vai,
e, em seu lugar magistral,
o atômico tropical
calor queima, me subtrai.
Idílica Era do Gelo:
regressa, vem congelar
esse mundo tão solar!
Aquele frio... Quero tê-lo...
Fábio Pedro Racoski
sábado, 31 de outubro de 2009
Análise sintética
Enfim,
chegou o fim.
Hora de começar.
Tudo acabou,
tudo se foi.
Hora de chegar.
Tudo passou,
tudo morreu.
Hora de nascer.
Tudo ódio,
tudo arranhão.
Hora da paixão.
chegou o fim.
Hora de começar.
Tudo acabou,
tudo se foi.
Hora de chegar.
Tudo passou,
tudo morreu.
Hora de nascer.
Tudo ódio,
tudo arranhão.
Hora da paixão.
Fábio Pedro Racoski
quarta-feira, 28 de outubro de 2009
República ou... ou... ?
“Liberdade, abre as asas sobre nós!” Assim roga o refrão do Hino da Proclamação da República, fato histórico ocorrido no dia 15 de novembro de 1889. Na manhã daquele dia, o marechal alagoano Deodoro da Fonseca deu início a uma mudança radical na forma de governar: o Império Brasileiro deixa de existir para se transformar na República do Brasil. Agora, podíamos eleger todos os governantes, desde o prefeito até o presidente.
Mas a República não começou assim: ela foi fruto de um golpe militar, comandado por oficiais de alta patente, que tinham como primeiro representante o marechal Deodoro da Fonseca. Assim que a junta militar tomou o poder, tratou de expulsar a família imperial do Brasil (que voltaria ao Brasil mais de 50 anos depois, sendo o maior exílio político da história de nosso país); muitos foram presos, torturados e mortos. O sonho de uma República no sentido da palavra (do latim “res publica”, "coisa pública") ficou para depois.
No início, apenas pessoas de classe média e as mais abastadas podiam votar. Depois de muitos anos, a mulher conquistou esse direito. Só nos anos 50 é que o Brasil viveu a primeira era realmente democrática, com eleições diretas para os poderes legislativo e executivo, abrangendo todos os cidadãos, sem distinção alguma.
Mas eis que, em 1964, os militares novamente tomam o poder, instaurando uma ditadura mortal e absurda que durou duas décadas. O milagre econômico dessa época se mostrou, décadas depois, uma mentira nojenta, uma farsa que trouxe dívidas astronômicas ao país.
Em 1989, cinco anos depois da campanha “Diretas Já!”, os brasileiros novamente poderiam escolher seu presidente. Numa democracia tão jovem e tão inexperiente, não é de se espantar que Fernando Collor tenha saído vitorioso, mesmo sem propostas concretas, e vindo a ser, depois, o protagonista do mais vergonhoso escândalo de corrupção do país.
Agora, em 2009, com algumas décadas acumuladas de República democrática, o Brasil ainda sofre com escândalos de corrupção, descaso das autoridades, deficiência em educação, saúde, transportes, segurança... Melhor que antes? Talvez.
E o que nós devemos fazer? Como diria Santo Agostinho: todos devemos ter o coração inquieto, assim como Martinho Lutero, frade agostiniano que se revoltou contra a sucursal do inferno que tinha se transformado a igreja católica. Nós também, temos como necessidade cultural e social estarmos sempre inquietos, a fiscalizar, cobrar, escolher bem o candidato a quem votar, até mesmo fazer panelaço: por que não? É de se invejar a politização de nossos hermanos argentinos.
Mas a República não começou assim: ela foi fruto de um golpe militar, comandado por oficiais de alta patente, que tinham como primeiro representante o marechal Deodoro da Fonseca. Assim que a junta militar tomou o poder, tratou de expulsar a família imperial do Brasil (que voltaria ao Brasil mais de 50 anos depois, sendo o maior exílio político da história de nosso país); muitos foram presos, torturados e mortos. O sonho de uma República no sentido da palavra (do latim “res publica”, "coisa pública") ficou para depois.
No início, apenas pessoas de classe média e as mais abastadas podiam votar. Depois de muitos anos, a mulher conquistou esse direito. Só nos anos 50 é que o Brasil viveu a primeira era realmente democrática, com eleições diretas para os poderes legislativo e executivo, abrangendo todos os cidadãos, sem distinção alguma.
Mas eis que, em 1964, os militares novamente tomam o poder, instaurando uma ditadura mortal e absurda que durou duas décadas. O milagre econômico dessa época se mostrou, décadas depois, uma mentira nojenta, uma farsa que trouxe dívidas astronômicas ao país.
Em 1989, cinco anos depois da campanha “Diretas Já!”, os brasileiros novamente poderiam escolher seu presidente. Numa democracia tão jovem e tão inexperiente, não é de se espantar que Fernando Collor tenha saído vitorioso, mesmo sem propostas concretas, e vindo a ser, depois, o protagonista do mais vergonhoso escândalo de corrupção do país.
Agora, em 2009, com algumas décadas acumuladas de República democrática, o Brasil ainda sofre com escândalos de corrupção, descaso das autoridades, deficiência em educação, saúde, transportes, segurança... Melhor que antes? Talvez.
E o que nós devemos fazer? Como diria Santo Agostinho: todos devemos ter o coração inquieto, assim como Martinho Lutero, frade agostiniano que se revoltou contra a sucursal do inferno que tinha se transformado a igreja católica. Nós também, temos como necessidade cultural e social estarmos sempre inquietos, a fiscalizar, cobrar, escolher bem o candidato a quem votar, até mesmo fazer panelaço: por que não? É de se invejar a politização de nossos hermanos argentinos.
terça-feira, 27 de outubro de 2009
Falta-nos
Disse Jesus:
"Eu sou o pão da vida.
Aquele que vem a mim
jamais terá fome;
e aquele que crê em mim
jamais terá sede".
Fome e sede;
de fé,
em pé,
de paz,
incapaz,
de cultura
formosura,
de poesia
filosofia.
Eita mundo
vagabundo!
"Eu sou o pão da vida.
Aquele que vem a mim
jamais terá fome;
e aquele que crê em mim
jamais terá sede".
Fome e sede;
de fé,
em pé,
de paz,
incapaz,
de cultura
formosura,
de poesia
filosofia.
Eita mundo
vagabundo!
Fábio Pedro Racoski
sábado, 24 de outubro de 2009
O olho do mal
Ai, meu olho esquerdo... Inchado, inflamado, "conjuntivítico". E eu, por dois dias, mantive minha rotina de trabalho com a órbita ocular fazendo pressão no cérebro, causando uma dor de cabeça incrivelmente latejante.
Depois de ouvir palavras dos colegas de trabalho como "por que veio trabalhar?", e os alunos, em concordância, "por que não ficou em casa, professor?", depois de trabalhar na sexta-feira até as 21:30 (normalmente seria até as 22:30), fui para casa, depois de horas de aulas de português. Acordei no sábado causando um tremendo susto em minha mãe e minha irmã, tamanha era a monstruosidade do sinistro olho moribundo.
"Vou te levar no médico da clínica", disse minha irmã (sob ordens de minha mãe). E lá fomos, ainda de manhã, pagar 40 reais para a consulta. Esperei dois minutos e a enfermeira convocou-me para a pré-consulta. Pressão como sempre, 12 por 8 (difícil para alguém da minha circunferência), temperatura sovacal normal, a língua uma beleza. E lá fui à outra sala, ser atendido por um médico de sotaque sulamericano.
O simpático hispânico pediu que eu desligasse o celular - e o fiz. Examinou novamente minhas entranhas bucais, examinou o olho-monstro (o que causou alguma dor), apontou-me uma lanterna ofuscante, pediu para que eu contasse a história do meu mal. "Estou passando colírio tobramicina", contei ao doutor. "Sí, sí, continuarás con ele.", disse o doutor, que me receitou mais dois medicamentos: um antibiótico cefalexina e uma pomada gentamicina. Disse-me que infecção no olho é coisa muito séria, e deve ser combatida por todas as vias - superiores, pelo menos.
Pechinchei preços na quarta farmácia para os antibióticos e continuei em busca da gentamicina, mais sumida e procurada que o Santo Graal. Depois de algumas sessões do tratamento intensivo, já no sábado à noite, a pelota verruguenta do olho esquerdo perdeu a coloração roxo-defunto para ganhar um tom vermelho-irritação. A aparência no rosto ainda lembra um Rocky Balboa surrado pelo Apollo Creed (só não grito pela Adrian).
O destino assombroso do olho do mal ainda está por vir...
Depois de ouvir palavras dos colegas de trabalho como "por que veio trabalhar?", e os alunos, em concordância, "por que não ficou em casa, professor?", depois de trabalhar na sexta-feira até as 21:30 (normalmente seria até as 22:30), fui para casa, depois de horas de aulas de português. Acordei no sábado causando um tremendo susto em minha mãe e minha irmã, tamanha era a monstruosidade do sinistro olho moribundo.
"Vou te levar no médico da clínica", disse minha irmã (sob ordens de minha mãe). E lá fomos, ainda de manhã, pagar 40 reais para a consulta. Esperei dois minutos e a enfermeira convocou-me para a pré-consulta. Pressão como sempre, 12 por 8 (difícil para alguém da minha circunferência), temperatura sovacal normal, a língua uma beleza. E lá fui à outra sala, ser atendido por um médico de sotaque sulamericano.
O simpático hispânico pediu que eu desligasse o celular - e o fiz. Examinou novamente minhas entranhas bucais, examinou o olho-monstro (o que causou alguma dor), apontou-me uma lanterna ofuscante, pediu para que eu contasse a história do meu mal. "Estou passando colírio tobramicina", contei ao doutor. "Sí, sí, continuarás con ele.", disse o doutor, que me receitou mais dois medicamentos: um antibiótico cefalexina e uma pomada gentamicina. Disse-me que infecção no olho é coisa muito séria, e deve ser combatida por todas as vias - superiores, pelo menos.
Pechinchei preços na quarta farmácia para os antibióticos e continuei em busca da gentamicina, mais sumida e procurada que o Santo Graal. Depois de algumas sessões do tratamento intensivo, já no sábado à noite, a pelota verruguenta do olho esquerdo perdeu a coloração roxo-defunto para ganhar um tom vermelho-irritação. A aparência no rosto ainda lembra um Rocky Balboa surrado pelo Apollo Creed (só não grito pela Adrian).
O destino assombroso do olho do mal ainda está por vir...
segunda-feira, 19 de outubro de 2009
Adeus, eu
Hoje,
aquela velha criança
com medo das ruas,
com medo dos outros,
com medo de si,
morreu.
Hoje
aquela velha criança
que já devia ter ido,
que arrastava uma
carcaça malcuidada,
se foi.
O velório
será longo.
O corpo
será cremado.
E das cinzas nascerá
o jovem adulto
há muito aprisionado.
E das cinzas nascerá
a Fênix luminosa
a brilhar
onde outrora havia
total escuridão.
aquela velha criança
com medo das ruas,
com medo dos outros,
com medo de si,
morreu.
Hoje
aquela velha criança
que já devia ter ido,
que arrastava uma
carcaça malcuidada,
se foi.
O velório
será longo.
O corpo
será cremado.
E das cinzas nascerá
o jovem adulto
há muito aprisionado.
E das cinzas nascerá
a Fênix luminosa
a brilhar
onde outrora havia
total escuridão.
Fábio Pedro Racoski
domingo, 18 de outubro de 2009
O infante aprendiz
Certo dia, encontrava-se Midei Shempaz dormindo sobre um banco da praça central de Kinze. Um garoto, beirando os sete anos, cutucou seu olho, fazendo o sábio acordar rapidamente e gritar: "não que ainda tô vivo!". Ao olhar para a criança, Midei Shempaz disse:
- Ah, piá: sabia que titio podia ter ficado cego, ou infartado?
- Desculpa, tio Midei Shempaz!
- Deixo, sim. Não tô brigando!
- Mas não é o nome do tio: Midei Shempaz?
- ... É mesmo, tem razão, piazinho inteligente. Diga: o que quer saber desse tio barbudo?
- Minha mãe disse que o senhor é muito inteligente.
- Ah, obrigado!
- Ela disse que eu preciso estudar pra ficar inteligente e não ser um bêbado vagabundo. Mas ela disse também que o senhor é um bêbado vagabundo, e que isso é ruim. Agora eu não entendi, se o senhor é inteligente, como pode ser bêbado e vagabundo.
- Sua mãe tem toda razão, menininho. Você precisa estudar pra ficar inteligente igual o tio aqui. Mas eu não sou bêbado e vagabundo: sou apenas um poeta filósofo que trabalha de apreciar a vida, a cidade, este banco da praça, aquela senhora que passa ali na rua...
- Ah, o senhor não é bêbado nem vagabundo?
- Não, menininho, não sou.
- Ôba, brigado tio! Vou falar pra minha mãe que eu posso ser igual o senhor quando crescer, porque o senhor não é bêbado nem vagabundo!
E, assim, Midei Shempaz garantiu para o futuro mais um sábio que, como ele, habitará as ruas destas terras do Curitestão.
- Ah, piá: sabia que titio podia ter ficado cego, ou infartado?
- Desculpa, tio Midei Shempaz!
- Deixo, sim. Não tô brigando!
- Mas não é o nome do tio: Midei Shempaz?
- ... É mesmo, tem razão, piazinho inteligente. Diga: o que quer saber desse tio barbudo?
- Minha mãe disse que o senhor é muito inteligente.
- Ah, obrigado!
- Ela disse que eu preciso estudar pra ficar inteligente e não ser um bêbado vagabundo. Mas ela disse também que o senhor é um bêbado vagabundo, e que isso é ruim. Agora eu não entendi, se o senhor é inteligente, como pode ser bêbado e vagabundo.
- Sua mãe tem toda razão, menininho. Você precisa estudar pra ficar inteligente igual o tio aqui. Mas eu não sou bêbado e vagabundo: sou apenas um poeta filósofo que trabalha de apreciar a vida, a cidade, este banco da praça, aquela senhora que passa ali na rua...
- Ah, o senhor não é bêbado nem vagabundo?
- Não, menininho, não sou.
- Ôba, brigado tio! Vou falar pra minha mãe que eu posso ser igual o senhor quando crescer, porque o senhor não é bêbado nem vagabundo!
E, assim, Midei Shempaz garantiu para o futuro mais um sábio que, como ele, habitará as ruas destas terras do Curitestão.
quarta-feira, 14 de outubro de 2009
Midei Shempaz e a definição de Céu e Inferno
Certo dia, chegou às ruas de Kinze um jovem padre, sedento pelo conhecimento escatológico que nem seu médico, nem seu bispo lhe ofereciam. Ele buscava por respostas sobre o Céu e o Inferno, e sabia que naquela cidade, naquelas ruas, perambulava um grande sábio.
Seguindo o rastro das barbas falhas do sábio, o jovem padre o encontrou, em uma taverna, bebendo o mais puro Steinhäger da região.
- És tu o grande sábio destas terras? -, pergunta o padre.
- Sim, sou eu, Midei Shempaz! -, responde ebriamente o sábio.
- Desculpe-me!
- Não, este é meu nome!
- Ah... Preciso saber de ti, ó sábio, qual a diferença entre o Céu e o Inferno?
- Vejo que você é padre. É, a Igreja é pouco prática nesses assuntos. Mas vamos lá, meu filho: imagine o Céu e o Inferno como duas festas de casamento. O Céu é o casamento de pobre: bêbados, cerveja barata, vinho barato, mulheres com vestidos horríveis, carne dura, briga. O Inferno é o casamento de rico: restaurante chique, champanhe, comida coisa fina, mulheres com vestidos de grife e siliconadas (algumas gostosas), alguns debates em conversas de cavalheiros e damas.
- Não entendo: dessa forma, parece que o Inferno é melhor que o Céu. -, respondeu, confuso, o padre.
- Parece mas não é, não, meu querido. No casamento de pobre, tudo se extravasa ali, a alma está na ponta da língua, na ponta dos dedos e no bafo de cerveja; o que se levam são os salgadinhos, dentro da bolsa, símbolos da experiência redentora. Isso, mesmo com bafo, é o Céu. No casamento de rico, tudo é aparência, é Photoshop, depois um fica maldizendo o outro, pelas costas; leva-se, dali, a luxúria e um suvenir, símbolo da experiência maldita. Ah, isso é um Inferno!
Ouvindo isto, o jovem se desfez de seu colarinho de padre, deixando de sentir a angústia sufocante da ignorância.
Seguindo o rastro das barbas falhas do sábio, o jovem padre o encontrou, em uma taverna, bebendo o mais puro Steinhäger da região.
- És tu o grande sábio destas terras? -, pergunta o padre.
- Sim, sou eu, Midei Shempaz! -, responde ebriamente o sábio.
- Desculpe-me!
- Não, este é meu nome!
- Ah... Preciso saber de ti, ó sábio, qual a diferença entre o Céu e o Inferno?
- Vejo que você é padre. É, a Igreja é pouco prática nesses assuntos. Mas vamos lá, meu filho: imagine o Céu e o Inferno como duas festas de casamento. O Céu é o casamento de pobre: bêbados, cerveja barata, vinho barato, mulheres com vestidos horríveis, carne dura, briga. O Inferno é o casamento de rico: restaurante chique, champanhe, comida coisa fina, mulheres com vestidos de grife e siliconadas (algumas gostosas), alguns debates em conversas de cavalheiros e damas.
- Não entendo: dessa forma, parece que o Inferno é melhor que o Céu. -, respondeu, confuso, o padre.
- Parece mas não é, não, meu querido. No casamento de pobre, tudo se extravasa ali, a alma está na ponta da língua, na ponta dos dedos e no bafo de cerveja; o que se levam são os salgadinhos, dentro da bolsa, símbolos da experiência redentora. Isso, mesmo com bafo, é o Céu. No casamento de rico, tudo é aparência, é Photoshop, depois um fica maldizendo o outro, pelas costas; leva-se, dali, a luxúria e um suvenir, símbolo da experiência maldita. Ah, isso é um Inferno!
Ouvindo isto, o jovem se desfez de seu colarinho de padre, deixando de sentir a angústia sufocante da ignorância.
O grande sábio Midei Shempaz
Há muito tempo, nas terras do Curitestão, vivia um jovem senhor chamado Midei Shempaz. Conhecido por sua sabedoria e sua apurada sensibilidade para questões do Céu e da Terra, Midei Shempaz era procurado por pessoas de diversas partes, curitãs ou estrangeiras, aos quais ensinava ou, segundo o próprio, "fazia-lhes enxergar sua sabedoria interior", com poucas palavras (normal para um curitão).
Vivendo como um mendigo nas ruas da capital de Curitestão, a cidade de Kinze, Midei Shempaz era admirado e respeitado por alguns, discriminado e odiado por outros – ódio que mais parecia temor. Seu passado como arqueiro-mor da 1ª divisão de artilharia de Curitestão rendia à sua pessoa a imagem de um homem forte e elegante. Para completar sua definição, Midei Shempaz era entusiasta de festas e bebedeiras, sendo campeão na disputa de Submarinos e chopes.
Midei Shempaz começou cedo seu caminho de sabedoria: já aos 13 anos ele sabia mais sobre física quântica e análise do discurso que seus professores. Aos 15, tentou publicar sua Teoria do Tudo e do Quase Nada. Mas como era muito pobre, não conseguiu fazê-lo. Em momentos de extrema crise de produção intelectual, produzia livros que considerava “sub-literatura”. Daí nasceu o gênero literário da auto-ajuda que, segundo Midei, foi seu “maior erro de todos os pisos da vida”.
Nas próximas edições, publicaremos um pouco da produção intelectual de Midei Shempaz, junto a alguns de seus ensinamentos, colhidos de seus discípulos. Tentaremos, também, resgatar a Teoria do Tudo e do Quase Nada, trabalho extremamente árduo mas que, se lograr êxito, revolucionará para todo o sempre o pensamento humano.
Vivendo como um mendigo nas ruas da capital de Curitestão, a cidade de Kinze, Midei Shempaz era admirado e respeitado por alguns, discriminado e odiado por outros – ódio que mais parecia temor. Seu passado como arqueiro-mor da 1ª divisão de artilharia de Curitestão rendia à sua pessoa a imagem de um homem forte e elegante. Para completar sua definição, Midei Shempaz era entusiasta de festas e bebedeiras, sendo campeão na disputa de Submarinos e chopes.
Midei Shempaz começou cedo seu caminho de sabedoria: já aos 13 anos ele sabia mais sobre física quântica e análise do discurso que seus professores. Aos 15, tentou publicar sua Teoria do Tudo e do Quase Nada. Mas como era muito pobre, não conseguiu fazê-lo. Em momentos de extrema crise de produção intelectual, produzia livros que considerava “sub-literatura”. Daí nasceu o gênero literário da auto-ajuda que, segundo Midei, foi seu “maior erro de todos os pisos da vida”.
Nas próximas edições, publicaremos um pouco da produção intelectual de Midei Shempaz, junto a alguns de seus ensinamentos, colhidos de seus discípulos. Tentaremos, também, resgatar a Teoria do Tudo e do Quase Nada, trabalho extremamente árduo mas que, se lograr êxito, revolucionará para todo o sempre o pensamento humano.
sábado, 10 de outubro de 2009
Tremei, Frestão!
"El ingenioso hidalgo Don Quijote de la Mancha, compuesto por Miguel de Cervantes Saavedra."
Estas foram as primeiras palavras lidas na capa de um livro publicado em 1605, que ganhou sua segunda parte em 1615 e, hoje, é considerada a mais fantástica obra literária que a humanidade já produziu. Dom Quixote, o louco de cada um; Sancho Pança, o prático e grosseiro que vive em nós; Dulcineia, o platonismo do qual não conseguimos fugir. Uma obra emocionante, o livro que já li três vezes, em espanhol, sem me assustar com suas mil e tantas páginas (e livro se conta assim?).
"Viajei" bastante para chegar no motivo dessa postagem: a escola de samba União da Ilha trará como tema de seu desfile, em 2010, "Dom Quixote de La Mancha: o cavaleiro dos sonhos impossíveis" (também se referindo à canção do espetáculo da Broadway, "O homem de La Mancha"). Ainda estão por escolher a canção que ilustrará esse tema, mas eu já antecipo a vencedora (a mais empolgante e "quixotesca"!):
Sou um tanto quanto avesso ao Carnaval, mas vou torcer para a União da Ilha. QUIXOTESCOS, UNAM-SE!
Estas foram as primeiras palavras lidas na capa de um livro publicado em 1605, que ganhou sua segunda parte em 1615 e, hoje, é considerada a mais fantástica obra literária que a humanidade já produziu. Dom Quixote, o louco de cada um; Sancho Pança, o prático e grosseiro que vive em nós; Dulcineia, o platonismo do qual não conseguimos fugir. Uma obra emocionante, o livro que já li três vezes, em espanhol, sem me assustar com suas mil e tantas páginas (e livro se conta assim?).
"Viajei" bastante para chegar no motivo dessa postagem: a escola de samba União da Ilha trará como tema de seu desfile, em 2010, "Dom Quixote de La Mancha: o cavaleiro dos sonhos impossíveis" (também se referindo à canção do espetáculo da Broadway, "O homem de La Mancha"). Ainda estão por escolher a canção que ilustrará esse tema, mas eu já antecipo a vencedora (a mais empolgante e "quixotesca"!):
Sou um tanto quanto avesso ao Carnaval, mas vou torcer para a União da Ilha. QUIXOTESCOS, UNAM-SE!
terça-feira, 6 de outubro de 2009
sexta-feira, 2 de outubro de 2009
MTV - canal da música???
MTV. Sigla que acompanha a definição original inglesa: "music television". Uns pronunciam de forma ligeiramente americanizada, "emitivi"; outros a proferem como "emetevê". Ainda há os que usam a forma "metevê", recordando a Fenemê - ou FNM, "Fábrica Nacional de Motores".
O nome prediz uma rede de televisão voltada totalmente à música, em todas suas nuances e manifestações. Mas isso não acontece: MTV poderia significar, acertadamente, "mainstream television". Em seus inúmeros clipes, documentários e noticiários, a temática não foge dos ritmos "globalizados" (rock, reggae, rap, R&B, etc.), do pop, e, como uma espécie de "cota", alguma coisa de samba.
Tão influente entre os jovens, a MTV se nega a divulgar boa parte da música consumida pelos mesmos, em diferentes regiões do Brasil: sertanejo, forró, vanerão... A emissora ainda tentou algo sobre o tecnobrega do Pará, e parou nisso. Sem falar em vertentes musicais que poderiam contar com o apoio de uma "Music Television": a música caipira, os ritmos regionais e folclóricos, que ainda sobevivem, mas encontram espaço na mídia única e exclusivamente dentro de canais culturais, como a TV Cultura ou a Futura.
Uma emissora de televisão administrada pelo grupo Abril tem cacife para ser muito mais do que é. Mas estaciona no mesmo geralzão desde há muito tempo. Enquanto isso, vai perdendo seus vejotas (ou VJ's) para outras emissoras. Na sessão de variedades (além da música), ainda consegue manter certa qualidade. Mas será difícil segurar Marcelo Adnet, Kika, Titi, Dani Calabresa, Bento Ribeiro e companhia dentro da emissora. Marcos Mion já foi para a emissora dos pastores da Universal...
O nome prediz uma rede de televisão voltada totalmente à música, em todas suas nuances e manifestações. Mas isso não acontece: MTV poderia significar, acertadamente, "mainstream television". Em seus inúmeros clipes, documentários e noticiários, a temática não foge dos ritmos "globalizados" (rock, reggae, rap, R&B, etc.), do pop, e, como uma espécie de "cota", alguma coisa de samba.
Tão influente entre os jovens, a MTV se nega a divulgar boa parte da música consumida pelos mesmos, em diferentes regiões do Brasil: sertanejo, forró, vanerão... A emissora ainda tentou algo sobre o tecnobrega do Pará, e parou nisso. Sem falar em vertentes musicais que poderiam contar com o apoio de uma "Music Television": a música caipira, os ritmos regionais e folclóricos, que ainda sobevivem, mas encontram espaço na mídia única e exclusivamente dentro de canais culturais, como a TV Cultura ou a Futura.
Uma emissora de televisão administrada pelo grupo Abril tem cacife para ser muito mais do que é. Mas estaciona no mesmo geralzão desde há muito tempo. Enquanto isso, vai perdendo seus vejotas (ou VJ's) para outras emissoras. Na sessão de variedades (além da música), ainda consegue manter certa qualidade. Mas será difícil segurar Marcelo Adnet, Kika, Titi, Dani Calabresa, Bento Ribeiro e companhia dentro da emissora. Marcos Mion já foi para a emissora dos pastores da Universal...
sábado, 26 de setembro de 2009
Amor num piscar de olhos
Era um dia solar,
desses que a luz do sol
dá à Terra uma lua
disfarçada de estrela.
Nesse dia,
numa rua pisoteada,
ele encontrou
o amor de sua vida.
Olhou em seus olhos,
levantou os ombros e a cabeça,
espremeu um lábio
contra o outro,
erguendo um pesado e fraco
sorriso.
Balançou a cabeça
na direção vertical.
Continuou seu caminho
de pisoteamento do asfalto.
E o vento de um ônibus
que cruzou a rua
levou para longe
seu belo destino.
desses que a luz do sol
dá à Terra uma lua
disfarçada de estrela.
Nesse dia,
numa rua pisoteada,
ele encontrou
o amor de sua vida.
Olhou em seus olhos,
levantou os ombros e a cabeça,
espremeu um lábio
contra o outro,
erguendo um pesado e fraco
sorriso.
Balançou a cabeça
na direção vertical.
Continuou seu caminho
de pisoteamento do asfalto.
E o vento de um ônibus
que cruzou a rua
levou para longe
seu belo destino.
Fábio Pedro Racoski
terça-feira, 22 de setembro de 2009
Cinza
E mais uma vez
minha esperança valeu.
A primavera chegou
com nuvens pesadas
e céu cinzento
como chumbo.
Ah, o cinza...
A paixão da minha vida
e da minha morte.
A cor dos meus olhos,
uma cor tão minha
ainda que impregnada em todos.
Gosto do cinza
como quem se afeiçoa
à imagem de um
palhaço triste.
Ou como quem se alegra
por gostar de algo
que ninguém gosta.
O cinza do rosto de Chaplin,
o cinza da quarta-feira,
o cinza do lápis com o qual
escrevi meus primeiros versos
(tentativas inúteis
de conquistar as mais belas
colegas de classe).
O cinza dos cabelos
que carregam história,
mais do que eu
posso aguentar.
Se o vermelho é paixão,
se o verde é esperança,
se o branco é paz
e o preto é luto,
o cinza é fruto
da mistura de alegria,
tristeza, gravidade
e serenidade
da vida só.
Não, não sou solitário:
sou cinza.
"Com todo direito a sê-lo."
minha esperança valeu.
A primavera chegou
com nuvens pesadas
e céu cinzento
como chumbo.
Ah, o cinza...
A paixão da minha vida
e da minha morte.
A cor dos meus olhos,
uma cor tão minha
ainda que impregnada em todos.
Gosto do cinza
como quem se afeiçoa
à imagem de um
palhaço triste.
Ou como quem se alegra
por gostar de algo
que ninguém gosta.
O cinza do rosto de Chaplin,
o cinza da quarta-feira,
o cinza do lápis com o qual
escrevi meus primeiros versos
(tentativas inúteis
de conquistar as mais belas
colegas de classe).
O cinza dos cabelos
que carregam história,
mais do que eu
posso aguentar.
Se o vermelho é paixão,
se o verde é esperança,
se o branco é paz
e o preto é luto,
o cinza é fruto
da mistura de alegria,
tristeza, gravidade
e serenidade
da vida só.
Não, não sou solitário:
sou cinza.
"Com todo direito a sê-lo."
Fábio Pedro Racoski
segunda-feira, 21 de setembro de 2009
Gisele Bündchen, embaixadora da ONU
Gisele Bündchen foi nomeada embaixadora da boa vontade pelo programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente.
Imagem de novembro de 2002. Protesto pelo uso de peles em campanhas publicitárias de moda.
É. Há sete anos, essa beldade foi chamada de "escória da pele" (nos cartazes) pelos manifestantes do PETA, organização que defende os direitos dos animais.
Peles, facas e voltas
O mink assassinado
brutalmente
viu seu cadáver
cobrir os seios de Gisele.
O Minc empossado
ministro bicho grilo
vê Gisele
com a missão
de salvar minks.
Como um Saulo
convertido
em Paulo.
Imagem de novembro de 2002. Protesto pelo uso de peles em campanhas publicitárias de moda.
É. Há sete anos, essa beldade foi chamada de "escória da pele" (nos cartazes) pelos manifestantes do PETA, organização que defende os direitos dos animais.
Peles, facas e voltas
O mink assassinado
brutalmente
viu seu cadáver
cobrir os seios de Gisele.
O Minc empossado
ministro bicho grilo
vê Gisele
com a missão
de salvar minks.
Como um Saulo
convertido
em Paulo.
Fábio Pedro Racoski
quinta-feira, 17 de setembro de 2009
Project Needlemouse
Para os apreciadores de jogos eletrônicos (também conhecidos como "gamemaníacos"), que jogaram Sonic no Mega Drive: a Sega promete um grande jogo para o próximo ano.
Sim: um novo jogo do Sonic, todo em 2D, onde será possível correr de verdade com o ouriço supersônico, como nos anos 90!
Sim: um novo jogo do Sonic, todo em 2D, onde será possível correr de verdade com o ouriço supersônico, como nos anos 90!
O não professor
Ele não tinha
os requisitos básicos
para ser
um professor.
Certo dia, depois de
cinco anos na profissão,
chegou para sua aula
repetitiva, cansada
e desgastada.
Um aluno, alheio à insatisfação
do professor,
ergue a voz numa pergunta:
vai passar lição importante hoje?
A verdade é que ele nunca passava
nada de importante,
apenas transcrições
de livros e materiais falhos.
Mas naquele momento,
depois de esbravejar
suas frustrações
no aluno
por eternidades,
foi ele o aluno
de sua própria saliva
cuspida em berros.
Ele não tinha
os requisitos básicos
para ser um professor:
paciência, dedicação,
amor, sangue
e um senso de humor
apuradíssimo.
os requisitos básicos
para ser
um professor.
Certo dia, depois de
cinco anos na profissão,
chegou para sua aula
repetitiva, cansada
e desgastada.
Um aluno, alheio à insatisfação
do professor,
ergue a voz numa pergunta:
vai passar lição importante hoje?
A verdade é que ele nunca passava
nada de importante,
apenas transcrições
de livros e materiais falhos.
Mas naquele momento,
depois de esbravejar
suas frustrações
no aluno
por eternidades,
foi ele o aluno
de sua própria saliva
cuspida em berros.
Ele não tinha
os requisitos básicos
para ser um professor:
paciência, dedicação,
amor, sangue
e um senso de humor
apuradíssimo.
Fábio Pedro Racoski
segunda-feira, 7 de setembro de 2009
Curso de Civismo - Módulo I
Brasileiros e brasileiras...
Até a metade dos anos 90, as escolas ensinavam civismo aos alunos. Era disciplina que, junto com OSPB (Organização Social e Política Brasileira), foi extirpada da grade escolar, na desculpa de ser uma herança da ditadura. Na verdade, civismo é uma lição de casa, de família, e não se faz necessária, a princípio, aula na escola sobre isso. Mas, como nada é perfeito... Lembro aqui, nessa postagem, os hinos que o Brasil (não só a Vanusa!) esquecem ou nunca aprenderam:
HINO DA INDEPENDÊNCIA
D. Pedro I, O Cara da independência, é o compositor da melodia deste hino. A letra é de Evaristo Ferreira da Veiga. Foi a primeira canção usada como tema nacional, ainda que não oficialmente.
HINO À BANDEIRA
A música deste hino foi composta por Francisco Braga, para poema do narcisista e arrogante mas, ainda assim, ótimo poeta, Olavo Bilac.
HINO DA PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA
O mais desconhecido, acredito eu. Tem letra de Medeiros e Albuquerque e música de Leopoldo Augusto Miguez. Comemora o golpe militar que foi a República. É: a República já começou errado!
HINO NACIONAL BRASILEIRO
O HINO. E não venha criticar a Vanusa: todos nós erramos, alguma vez, sua canção. Em maior ou menor grau. É um hino que ganhou a letra atual, de Joaquim Osório Duque Estrada, contemporâneo de Olavo Bilac (e também poeta parnasiano), em 1922, na comemoração do primeiro centenário da Independência. A música, de Francisco Manuel da Silva, contemporâneo da Independência, serviu a outras letras (inclusive uma letra para a atual introdução instrumental).
A letra é difícil? Não: ela é apenas extremamente formal, culta e poética. Já ouvi propostas de simplificação do poema no hino. Isso é um absurdo: não é o hino que deve ser "simplificado". É o povo que deve receber uma educação boa o suficiente para compreender o que se canta no Hino Nacional.
Bela composição, poema maravilhoso, é o "Hors-Concours" (ó-concur) entre os hinos que considero belos.
Na Wikipédia há um vocabulário básico para melhor se entender o hino. Infelizmente, não nos dão estudo sobre este poema na escola.
Margens plácidas - "Plácida" significa serena. Calma.
Ipiranga - É o riacho junto ao qual D. Pedro I teria proclamado a independência.
Brado retumbante - Grito forte que provoca eco.
Penhor - Usado de maneira metafórica(figurada). "penhor desta igualdade" é a garantia, a segurança de que haverá liberdade.
Imagem do Cruzeiro resplandece - O "Cruzeiro" é a constelação do Cruzeiro do Sul que resplandece (brilha) no céu.
Impávido colosso - "Colosso" é o nome de uma estátua de enormes dimensões. Estar "impávido" é estar tranqüilo, calmo.
Mãe gentil - A "mãe gentil" é a pátria. Um país que ama e defende seus "filhos" (os brasileiros) como qualquer mãe.
Fulguras - fulgurante (reluzente, brilhante).
Florão - "Florão" é um ornato em forma de flor usado nas abóbadas de construções grandiosas. O Brasil seria o ponto mais importante e vistoso da América.
Garrida - Enfeitada. Que chama a atenção pela beleza.
Lábaro - Sinônimo de bandeira. "Lábaro" era um antigo estandarte usado pelos romanos.
Clava forte - Clava é um grande porrete, usado no combate corpo-a-corpo. No verso, significa mobilizar um exército, entrar em guerra.
Até a metade dos anos 90, as escolas ensinavam civismo aos alunos. Era disciplina que, junto com OSPB (Organização Social e Política Brasileira), foi extirpada da grade escolar, na desculpa de ser uma herança da ditadura. Na verdade, civismo é uma lição de casa, de família, e não se faz necessária, a princípio, aula na escola sobre isso. Mas, como nada é perfeito... Lembro aqui, nessa postagem, os hinos que o Brasil (não só a Vanusa!) esquecem ou nunca aprenderam:
HINO DA INDEPENDÊNCIA
D. Pedro I, O Cara da independência, é o compositor da melodia deste hino. A letra é de Evaristo Ferreira da Veiga. Foi a primeira canção usada como tema nacional, ainda que não oficialmente.
HINO À BANDEIRA
A música deste hino foi composta por Francisco Braga, para poema do narcisista e arrogante mas, ainda assim, ótimo poeta, Olavo Bilac.
HINO DA PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA
O mais desconhecido, acredito eu. Tem letra de Medeiros e Albuquerque e música de Leopoldo Augusto Miguez. Comemora o golpe militar que foi a República. É: a República já começou errado!
HINO NACIONAL BRASILEIRO
O HINO. E não venha criticar a Vanusa: todos nós erramos, alguma vez, sua canção. Em maior ou menor grau. É um hino que ganhou a letra atual, de Joaquim Osório Duque Estrada, contemporâneo de Olavo Bilac (e também poeta parnasiano), em 1922, na comemoração do primeiro centenário da Independência. A música, de Francisco Manuel da Silva, contemporâneo da Independência, serviu a outras letras (inclusive uma letra para a atual introdução instrumental).
A letra é difícil? Não: ela é apenas extremamente formal, culta e poética. Já ouvi propostas de simplificação do poema no hino. Isso é um absurdo: não é o hino que deve ser "simplificado". É o povo que deve receber uma educação boa o suficiente para compreender o que se canta no Hino Nacional.
Bela composição, poema maravilhoso, é o "Hors-Concours" (ó-concur) entre os hinos que considero belos.
Na Wikipédia há um vocabulário básico para melhor se entender o hino. Infelizmente, não nos dão estudo sobre este poema na escola.
Margens plácidas - "Plácida" significa serena. Calma.
Ipiranga - É o riacho junto ao qual D. Pedro I teria proclamado a independência.
Brado retumbante - Grito forte que provoca eco.
Penhor - Usado de maneira metafórica(figurada). "penhor desta igualdade" é a garantia, a segurança de que haverá liberdade.
Imagem do Cruzeiro resplandece - O "Cruzeiro" é a constelação do Cruzeiro do Sul que resplandece (brilha) no céu.
Impávido colosso - "Colosso" é o nome de uma estátua de enormes dimensões. Estar "impávido" é estar tranqüilo, calmo.
Mãe gentil - A "mãe gentil" é a pátria. Um país que ama e defende seus "filhos" (os brasileiros) como qualquer mãe.
Fulguras - fulgurante (reluzente, brilhante).
Florão - "Florão" é um ornato em forma de flor usado nas abóbadas de construções grandiosas. O Brasil seria o ponto mais importante e vistoso da América.
Garrida - Enfeitada. Que chama a atenção pela beleza.
Lábaro - Sinônimo de bandeira. "Lábaro" era um antigo estandarte usado pelos romanos.
Clava forte - Clava é um grande porrete, usado no combate corpo-a-corpo. No verso, significa mobilizar um exército, entrar em guerra.
Dia da Pátria
Hoje é um dia estranho.
Militares republicanos
comemoram
o ato de um monarca
fundando sua própria
monarquia.
Hoje é um dia estranho.
"O último a sair que apague a luz,
mas eu vou lá na avenida, ver
o desfile!"
Hoje é um dia estranho.
Dia para exercer o patriotismo,
e brasileiro desce para a praia,
liga a televisão
e assiste bandas gringas.
(afinal, patriotismo é para
copa do mundo)
Hoje é um dia estranho.
Dia para cantar
dois hinos que ninguém sabe.
Dia para lembrar
a história que o brasileiro esqueceu.
Dia para viver
um amor que o brasileiro não tem.
E viva o 7 de Setembro!
E viva Dão Pedro pelo feriadão!
Militares republicanos
comemoram
o ato de um monarca
fundando sua própria
monarquia.
Hoje é um dia estranho.
"O último a sair que apague a luz,
mas eu vou lá na avenida, ver
o desfile!"
Hoje é um dia estranho.
Dia para exercer o patriotismo,
e brasileiro desce para a praia,
liga a televisão
e assiste bandas gringas.
(afinal, patriotismo é para
copa do mundo)
Hoje é um dia estranho.
Dia para cantar
dois hinos que ninguém sabe.
Dia para lembrar
a história que o brasileiro esqueceu.
Dia para viver
um amor que o brasileiro não tem.
E viva o 7 de Setembro!
E viva Dão Pedro pelo feriadão!
Fábio Pedro Racoski
September Seven
sábado, 5 de setembro de 2009
Amor verdadeiro
Um casal abraçado.
Um aconchega o outro.
Ele barbudo, barrigudo e feio.
Ela gorda, sebosa e também feia.
Um carinho sincero,
a cena do amor.
Por mais que eles não se amem,
por mais que eles não sejam
formosos.
Talvez porque eles sejam
exatamente o oposto.
Um aconchega o outro.
Ele barbudo, barrigudo e feio.
Ela gorda, sebosa e também feia.
Um carinho sincero,
a cena do amor.
Por mais que eles não se amem,
por mais que eles não sejam
formosos.
Talvez porque eles sejam
exatamente o oposto.
Fábio Pedro Racoski
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terça-feira, 1 de setembro de 2009
Gdansk, minha e sua
Hoje, primeiro dia do mês de setembro de 2009, fazem 70 anos que a Segunda Guerra Mundial começo. A guerra que simplesmente mudou por completo a história do mundo: mais que Alexandre, mais que Jesus, mais que Gêngis Khan, mais que Napoleão.
Há exatos setenta anos, a cidade polonesa de Gdansk foi invadida pela blitzkrieg nazista. Respondendo à invasão da Polônia, Reino Unido e França declaravam guerra à Alemanha. Varsóvia é destruída no mesmo ano. Já em 40, os alemães invadem a Holanda, a França... A partir daí, todos os eventos que conhecemos, lemos, ouvimos: do outro lado do mundo, o Império japonês invade meia Ásia, promove uma série de conquistas e constrói - também eles - campos de extermínio. Os Estados Unidos da América entram na guerra, alterando seus rumos drasticamente. Os pracinhas brasileiros, ao lado dos estadunidenses, promovem na Itália uma campanha desastrosa e, ao mesmo tempo, heroica: soldados totalmente despreparados que alcançaram vitórias relevantes. O dia D, as bombas, os horrores, as belas e trágicas histórias... Um novo mundo nasceu daquela Gdansk invadida.
FILHOS DE GDANSK
Gdansk,
pobre cidade polaca.
Entrou para a históra
após parir um novo mundo,
fruto do estupro promovido
pelas tropas de Hitler.
Gdansk,
profeta do destino polaco.
Sobre os escombros de Varsóvia,
sobre os corpos empilhados,
engatinhava o Mundo Novo.
Gdansk,
minha mãe perseverante.
Sobreviveu.
Ergueu a cabeça
e os ombros
para ver seu menino
tocar o terror,
compor um rock,
fazer amor,
brincar com bodoque.
Há exatos setenta anos, a cidade polonesa de Gdansk foi invadida pela blitzkrieg nazista. Respondendo à invasão da Polônia, Reino Unido e França declaravam guerra à Alemanha. Varsóvia é destruída no mesmo ano. Já em 40, os alemães invadem a Holanda, a França... A partir daí, todos os eventos que conhecemos, lemos, ouvimos: do outro lado do mundo, o Império japonês invade meia Ásia, promove uma série de conquistas e constrói - também eles - campos de extermínio. Os Estados Unidos da América entram na guerra, alterando seus rumos drasticamente. Os pracinhas brasileiros, ao lado dos estadunidenses, promovem na Itália uma campanha desastrosa e, ao mesmo tempo, heroica: soldados totalmente despreparados que alcançaram vitórias relevantes. O dia D, as bombas, os horrores, as belas e trágicas histórias... Um novo mundo nasceu daquela Gdansk invadida.
FILHOS DE GDANSK
Gdansk,
pobre cidade polaca.
Entrou para a históra
após parir um novo mundo,
fruto do estupro promovido
pelas tropas de Hitler.
Gdansk,
profeta do destino polaco.
Sobre os escombros de Varsóvia,
sobre os corpos empilhados,
engatinhava o Mundo Novo.
Gdansk,
minha mãe perseverante.
Sobreviveu.
Ergueu a cabeça
e os ombros
para ver seu menino
tocar o terror,
compor um rock,
fazer amor,
brincar com bodoque.
Fábio Pedro Racoski
Cordas parafusadas
Imitando meu nobre colega Igor Ravasco, do blogue Carta e Verso, trago a vocês, caros leitores, um pouco daquele que é o instrumento símbolo de Portugal: a guitarra portuguesa ou, simplesmente, guitarra.Parece um bandolim, mas não é. Parece viola, mas não é. As cordas são esticadas por parafusos (aqueles pinos no leque da cabeça), num sistema mecânico complexo, diferente dos violões e outros, que usam tarraxas. É a alma do fado, mas também aparece em outros ritmos. São 12 cordas, com afinações variadas (as principais são "Coimbra" e "Lisboa").
Também acompanhada, belamente, por voz:
Também acompanhada, belamente, por voz:
sexta-feira, 28 de agosto de 2009
DIA SEM FIM - O retorno
Caro leitor, cara leitora,
Há alguns meses eu postei um conto de minha autoria neste blogue. O "Dia sem fim" foi publicado em onze partes, no estilo folhetim. Decidi reuni-las e publicar o conto completo.
Para quem tiver paciência e curiosidade o suficiente e quiser se aventurar nessa literatura barata, aqui está o "Dia sem fim" no Google Docs:
http://docs.google.com/View?id=dg66df7z_0gz6ghhhg
Ou, se preferir, pode ler o conto dentro do blogue, clicando aqui.
Mais um dia terrível.
Visita de domingo: família, amigos e penetras reunidos em torno de uma maionese ruim. Ao cair da noite, todos se foram dentro do Interbairros II, o verdejante expresso infernal que conduz milhares de almas por dentro de Curitiba. Chutando os chinelos, desfaleci sobre a cama.
Então aconteceu o primeiro pesadelo: o céu estava em chamas. Olhei pela janela do quarto e vi bombas incendiárias destruindo nossas casas de madeira. O napalm cruzava a superfície e impregnava seu mau cheiro pelo ar. Queria sair dali, queria correr para longe, fugir para a Austrália. Não podia mais.
Mas, ei! Não moro em casa de madeira! Não sou um vietnamês prestes a correr do napalm ao lado de Kim Phuc! Não: não era verdade! Levantei e fui até a cozinha para tomar água. Levo um susto mortal: alguém arrombou a porta. Eram dois oficiais da SS nazista; eles me renderam. Estavam me conduzindo até o caminhão, mas, ao passar pela porta, alguma força me prendeu. Os chucrutes ficaram para fora; eu, para dentro, encarcerado por uma parede invisível que me jogava para o interior da casa.
Mais um sonho, só pode ser! Tomei um gole de vinho barato. Mais um. E outro. Apliquei beliscões no braço: nada. Voltei à cama, mas um forte tremor me fez levantar e espiar pela janela: milhares e milhares de cavalos, cavaleiros, lanceiros, todos bradando: “Alerrándros, Alerrándros, Alerrándros!”
Uma flecha atingiu o vidro de onde eu assistia aos macedônios e tudo caiu num clarão ofuscante. Depois que essa luz se apagou, só se via destruição por tudo. Meu Deus! Era Hiroshima! Eu estava viajando por tempos e lugares? Qual a procedência do vinho? O que minha tia pôs naqueles croquetes?
Fechei os olhos e, ao abri-los novamente, não havia mais casa, cama, paredes... Eu via pessoas sendo chicoteadas, estupradas, esquartejadas, escravizadas, roubadas... Um buraco abriu debaixo de mim e eu caí. Caí por horas, minutos... Até que me estatelei contra mim mesmo na cama de minha casa.
Eita, pesadelo! Eram seis da manhã de segunda-feira. Já havia perdido o Interbairros II que me leva ao serviço na hora certa. Atrasado de novo! Saí em disparada, mas o sol brilhava azul numa rua que era outra...
Só podia ser droga, mesmo. Ou, então, uma experiência religiosa... Não: lá vinha o Interbairros II. Mas não era verde: estava azul. Deixando meu daltonismo momentâneo de lado, entrei na condução.
Estranho: o motorista era outro. O cobrador também. Não havia ninguém conhecido no ônibus. Apenas pessoas de cabeça raspada, todas, e roupas alaranjadas. Alguém me cumprimenta: “purifica-te ao Imperador, forasteiro!” Não entendi e nunca entenderei essa saudação. Ao entregar o dinheiro para o cobrador, este me devolve: “nunca vimos estas cédulas por aqui; não são cédulas do Imperador. É um invasor! Atirai-o para fora!” E lá fui eu, voando lentamente para um encontro do meu nariz com o concreto áspero da calçada.
Desmaiei. Quando acordei, estava dentro de casa. Deixei cair o café sustentado em minhas mãos. Vesti o macacão e fui em direção ao meu emprego de metalúrgico. Eram seis da manhã e o sol brilhava vermelho no céu...
Estava atrasado: precisava correr para alcançar o Interbairros II. Consegui! Entrei e... um ônibus lotado como eu nunca tinha visto, repleto de mulheres em túnicas transparentes. Elas cantavam coisas estranhas e me jogavam flores. “Seja bem-vindo, estrangeiro”, disse a mais bela. Quando comecei a gostar desse devaneio (ou não...), uma força me puxa, fazendo cair estatelado na sala de minha casa.
Levantei, vesti meu jaleco e saí em direção à escola onde dou aulas. Eram seis da manhã de segunda-feira e eu estava atrasado para o Interbairros II de sempre. O sol brilhava roxo no céu. Percebi que alguma coisa estava fora do comum: os sonhos pareciam reais; as sensações pareciam sentidas; o Interbairros II parecia um bom ônibus. Resolvi não pegar condução. Liguei para a escola avisando sobre minha falta recém-planejada. Eles nem se importam: hoje (hoje?) era minha permanência. Não veria alunos e alunas.
Resolvi caminhar pelas ruas da vizinhança e, ao dobrar uma esquina, me encontro com uma de minhas alunas, Irina. “Onde você vai, professorzinho?”, indagou-me Irina. Não sabia o que responder. Não sabia se ainda era sonho, pois Irina é uma de minhas alunas mais dedicadas. E bela, ainda que eu a veja como uma filha. “Eu também estou perdida, nem sei se hoje é hoje. É por causa desse sol agora roxo!”
O que Irina disse fez-me palpitar de tal forma que precisei buscar assento no meio-fio. Como ela sabia que eu estava perdido, se nem eu mesmo tinha pensado nisso? Estávamos nós dois nesse turbilhão espaço-temporal-alucinógeno?
Continuamos eu e Irina à frente na calçada destruída pela incrível força das raízes de árvores. Aquele sol brilhando roxo e transformando o céu num bordô-rosê uniforme me causava náuseas. “Calma, professor: quando passar o efeito, você vai ficar bem!”, disse Irina. “Efeito de drogas? Como, se eu não sou drogado?”, indaguei a moça religiosamente.
Enquanto caminhávamos, Irina me explicou que o que causa as náuseas é o sol roxo. Ela afirmava estar sóbria. Quanto a mim: eu já não sabia. Tinha dúvidas de quanto vinho bebi: a cor do céu não me deixava esquecê-lo. Nesse espaço de silêncio para as minhas divagações, um clarão surgiu diante de nós. “Fique calmo, professor”, disse Irina – quem eu deveria conduzir agora me conduz! “É só o Tesla!”
E era mesmo: alguém que poderia passar por sósia de Frank Zappa vestindo roupas de época. Nikola Tesla, inventor do motor trifásico, experimentador da descarga de Tesla e, para alguns, o criador do “raio da morte”. Ali, à minha frente. “Ele está e não está aqui, professor”, educou-me mais uma vez Irina. “Como assim: está e não está? Holografia? Alucinação?”, perguntei, embriagado de informações confusas e improváveis.
Segundo Irina, o que avistávamos então era uma ligação entre espaços, tempos, universos, mundos de imaginação e orgânicos. “Não é um buraco de minhoca”, disse a aluna-mestra antes que eu o terminasse de pensar. “Você viveu essa experiência, de maneira mais intensa, hoje à noite”.
Agora eu estava realmente com medo: “COMO VOCÊ SABE DISSO?” Irina amarrou seus cabelos pretos, deixando revelar ainda mais a face pálida. Olhou-me da maneira mais profunda que alguém me olhou desde que saí da casa de minha mãe e disse, suavemente: “fui eu quem levou o professor a viver aquilo. E por isso você está aqui. Nós precisamos do senhor!”
Quem precisava? E para que um professor de história seria útil num mundo de devaneios? Eu quero acordar...
De um instante para outro, o mundo que aprendi a contar para alunos, amigos e familiares era para mim um desconhecido. Eu me sentia como um bebê ao ver pela primeira vez a luz do sol. Não entendia como fui, ao mesmo tempo, no mesmo instante, secretário e metalúrgico, profissões que nunca ousei exercer. Minha sensação era talvez igual à de uma girafa arrancada de sua savana na África e presa num zoológico em Nova Iorque. Tudo para mim era alienígena. Eu só conseguia identificar-me a mim mesmo através da Irina de pele branquíssima e olhos pretos.
“O senhor é o único que pode arrumar toda essa bagunça, professor”, disse-me Irina com os olhos de ver pai. “Eu? Arrumar? Arrumar o quê?”, o único pensamento frutífero em minha mente. “Arrumar os mundos que se misturaram”. Segundo minha querida aluna (seria eu aluno e ela a professora?), o sol roxo, os devaneios da minha última noite de sono, as viagens inexplicáveis entre mundos de sóis multicolores, isso tudo era resultado do prólogo de uma tragédia: mundos se chocando, uns contra os outros, e acabando com a realidade em cada um para que exista uma só, onde o Imperador governe.
“Não são universos paralelos!”, exclamou Irina, novamente antecipando-se ao meu pensamento. “São mundos diferentes, não-paralelos, não-lineares. Mundos reais e imaginários. Olhe no seu relógio, professor. Já se passaram dezenove horas de segunda-feira e ainda estamos com o sol, ainda que roxo, da manhã. Veja lá, no fim da rua: aquele vestido de casaca azul. É o Werter!”
Werter não é, nem de perto, meu preferido no mundo da imaginação literária. Então: o que ele fazia ali? Como mundos imaginários podem invadir a realidade? Era o vinho, só podia ser. Mas Irina leu meus pensamentos e arrematou: “Há mundos imaginados tão intensamente que ganham força para preencher dimensões físicas, ainda que não sejam as nossas. Quem sabe eu seja um sonho seu, professor. Para mim o senhor é o professor que eu sempre sonhei em ter: afeto de pai, carinho de amigo e porte de mestre”.
Nunca havia me emocionado com declarações de alunos. Os presentes de fim de ano, carro de som, homenagens... Mas o que Irina disse me tocou de verdade, pois seus olhos negros não vestiam a capa da falsidade. Não me surgiam respostas, agradecimentos. Somente uma vontade forte de beijá-la a testa e foi o que fiz.
“Por favor, Irina, me explique: por que esses mundos – um mais insano que o outro - estão se mesclando? Quem é esse Imperador (tivemos vários)? Por que eu e para quê?”
“Você, professor, é mestre, educador, quem prepara a Humanidade para receber conhecimento. É mestre da história, que carrega toda a Humanidade milenar. Por isso você é um escolhido”, disse-me Irina com voz firme. Novamente, eu não tinha palavras.
“Você já se perguntou, professor, se o mundo em que vivemos existe mesmo ou é apenas uma ilusão?”, dirigiu-se a mim Irina, que há pouco me tratava por senhor. Viver num mundo de ilusão: é a crença de Platão, Berkeley, irmãos Wachowski... “Nós não somos reais?”, perguntei. “Sim, professor, somos. Tente imaginar como se sentem Werter, Dom Quixote, Gúliver...”
Dom Quixote? Meu herói da adolescência existe em um desses mundos? “Sim, professor. Há muitas pessoas que viveram intensamente o Quixote. Ele cavalga sobre o Rocinante, ao lado de Sancho Panza, pelo mesmo mundo do Werter.”
“Mas você não me respondeu, Irina: quem é o Imperador e por que diabos mundos se misturam, meu Deus?”, indaguei Irina impacientemente. “A fusão dos mundos só está acontecendo porque o universo dos sonhos – onde vivem Quixote, Rei Artur, Dom Casmurro – perdeu a sustentação de sua órbita.” Perguntei se era o Sol, por acaso. No que a aluna me respondeu: “não exatamente. É todo um universo de pensamentos que está perdendo a luz. Aí é que entra seu papel, professor: descobrir qual a relação do Imperador com o apagar dessa luz.”
Como? Faltou ainda explicar quem é o Imperador. Não faltou mais: “o Imperador, professor, é alguém ou alguma coisa que foi banido do universo dos sonhos e, desde então, planeja sua volta. Agora, com a fusão dos dois mundos, o nome Imperador aparece em sonhos das pessoas escolhidas para essa batalha.”
“Uma batalha? Eu vou ter que pegar em rifles e lutar contra esse carcamano?”, perguntei assustado a Irina. “Não, professor. A batalha é contra a fusão dos mundos: se eles se misturarem de vez, os dois deixarão de existir. Precisamos do Imperador, para saber como podemos impedir essa fusão.”
“E onde eu encontro esse Imperador?”, perguntei já sonolento. “Em seus sonhos, professor. Mas você precisa esperar mais duas pessoas antes de dormir. São dois escolhidos para a batalha: Wellington e Sarah.”
Eu os conheço: Wellington é zelador de uma das escolas onde trabalho. Sarah é balconista em uma padaria perto da minha casa. Eis a situação: um professor de história, fã de música caipira; um zelador que “curte” reggae; e uma balconista adolescente metaleira. Escolhidos ecléticos...
Irina explicou-me: “Wellington gosta de ler, principalmente fábulas heróicas ao estilo Senhor dos Anéis. Sarah é a música e, também, a que tem mais espiritualidade aqui. Espere, professor, que logo vocês vão encontrar o Imperador.”
Eu já não me embriagava mais de informações, ainda que o clima parecesse muito psicodélico para alguém que não consumiu LSD. Enquanto esperava para dormir – vejam só! –, cantarolava melodias das canções de minha infância. “Ando devagar porque já tive pressa e levo esse sorriso porque já chorei demais...” Eis que Irina, tão jovem, continuou a canção junto a mim. E lá fomos nós, cantarolando músicas de Almir Sater, Tião Carreiro, Silvio Britto, Pena Branca e Xavantinho... Músicas: formavam meu elo com a “realidade” que eu um dia vivi.
Depois de eu e Irina passarmos por todo o repertório violeiro, chegando até mesmo a Mercedes Sosa, Atahualpa Yupanqui e Joan Manuel Serrat, chegam enfim os dois “escolhidos”. “Vocês não se sentem num manicômio?”, perguntei. “Não: esse mundo maluco é muito melhor que o mundo da minha infância com pai bêbado que batia em mim.”, respondeu Wellington que, sim, teve uma vida de muitos obstáculos. Sarah, sempre lacônica, resumiu-se num simples “é estranho”.
“É hora de começar o sono.”, conclamou-nos Irina. Não haveria de ser em plena calçada. “Vamos para minha casa, que ainda existe, eu acho.”, disse Wellington.
E lá fomos. Uma casa simples, pequena, porém muito rica em detalhes e cuidados. Acabamos nos estendendo em colchões e sofá. “E agora?”, perguntou Sarah. “Durmam, simplesmente. A gente se encontra lá nos sonhos.”, finalizou Irina. Todos os quatro estávamos muito ansiosos e entupidos de medo: seria difícil dormir assim. Mas, do nada, um sono se abateu sobre nós, como se fosse um veneno, uma droga, um medicamento. A luta para fechar os olhos passou a ser uma batalha para deixá-los abertos. Batalha à qual todos se renderam.
Mais uma vez, um sonho estranho: eu só avistava uma neblina púrpura muito densa por todos os lados, e ouvia a voz de uma criança cantarolando qualquer canção. Chamava pela Irina e não tinha resposta. “Wellington? Sarah?”, nada... O que existia: a voz da criança a cantar e a neblina púrpura. Mais nada. E a voz da criança cada vez mais próxima. “Tolle lege””, ela cantava num latim macarrônico. “Tolle lege, tolle lege.”, tomar e ler o quê? Lembrei: esse é o canto que Agostinho ouviu e acabou levando-o a converter-se cristão. “Sonhos! Poupem-me de experiências religiosas agora, por favor!”, respondi encarando a neblina. Eis a réplica recebida: “tolle lege, tolle lege”. Essa repetição preenchendo o nada em minha volta parecia me deixar embriagado novamente. A Irina disse: “A gente se encontra lá nos sonhos.”, mas aonde estão todos? Nunca acreditei em poder de sonhos, mágica, universos paralelos, religião. Por que haveria de crê-los agora? Era mais um sonho, só isso. Tudo isso deve ser sonho, mesmo, e amanhã, segunda-feira, eu levantarei às seis para trabalhar.
Uma voz diferente, firme e já rouca do tempo, interrompe o sonho insólito: “Não negue a si mesmo, filho!”. Pai? Meu falecido pai? O vinho era forte... “Não se negue ao que você realmente crê!”, repetia meu pai. “Você está morto, pai.”, respondi. “Mas ainda vivo, em você, em outro lugar.”, replicou a voz de meu progenitor. E passei a divagar, pensar sobre mim mesmo. Por viver o modismo particular de ser cético, deixei de experimentar sentimentos comuns até mesmo para céticos, como o amor, a paixão, a compaixão. Talvez aquele sonho fosse uma prova à minha farsa. Talvez todos esses fenômenos bizarros tenham sentido fora do meu falso ceticismo.
A neblina púrpura se desfez. A voz da criança calou-se e pude ver, à minha frente, os “escolhidos”, Irina, Sarah, Wellington.
Agora estávamos reunidos em sonho! Será? Ainda desconfiava da realidade e dos sonhos. Ainda era forte em mim a sensação de que acordaria às seis da manhã de segunda-feira para trabalhar, apesar de tudo.
“Aqui vamos encontrar a resposta.”, disse Irina, obviamente falando sobre imperadores impossíveis. O cenário vazio do sonho-reunião foi preenchido subitamente por enormes edifícios: todos da mesma forma e apresentando a mesma cor de ferro e vidro. Sarah abriu um sorriso, esticou o dedo indicador para um entre os inúmeros prédios e disse: “Lá!” A sensibilidade da moça nos conduzindo?
E para aquela direção fomos. E eu que pensava serem os sonhos lugares onde não há limitações físicas! Caminhamos, caminhamos, até chegar à porta de entrada da torre igual. Tudo parecia muito real para um sonho, pensei. E Irina leu meus pensamentos novamente: “não é um sonho. É realidade. Estamos na outra parte, no mundo da imaginação. Dormir era uma forma de virmos para cá. Numa situação normal, seria um sonho. Mas nessa mistura de mundos, não.”
Realmente. Percebi isso porque nesse instante ocorreu uma situação inusitada: um escaravelho gigante passando por nós como se estivesse nos cumprimentando. “É o Gregor Samsa! É como eu o imagino!”, exclamou admirado Wellington.
Entramos no edifício. E eis um fato estranho. Um saguão de entrada como que futurista, acompanhando a arquitetura do prédio: funcional, monocromática, sem adornos, sem arte, sem humanidade. Uma frase em latim quebrava a monotonia do lugar: “OBLIVIO IMPERATOR MUNDI”.
Tudo sumiu. O que vi diante de mim foi o braço do sofá. Acordei. Acordamos. Mais um sonho dentro do pesadelo pelo qual passávamos. “Vocês estavam lá? Viram o escaravelho, a frase em latim?”, perguntou Sarah. A resposta afirmativa de todos foi um atônito balançar de cabeça. “Alguém entende latim?”, perguntei, já descrente de uma afirmação. Para minha surpresa, Sarah alegou conhecer a língua. “Fortuna Imperatrix Mundi significa Sorte (fortuna) imperatriz do mundo. Oblivio Imperator Mundi quer dizer ‘Esquecimento Imperador do Mundo’”.
“Hã? O Imperador é o esquecimento? A falta de memória? Isso não tem sentido!”, afirmei impaciente. “Mas eu disse que esse Imperador poderia ser alguma coisa e não alguém.”, replicou serenamente Irina. O imperador a quem devemos derrotar é o esquecimento. De quê? A falta de memória do povo: seria isso? É o que nós quatro discutíamos. Eu já não tinha mais paciência: esquecimento, sonhos, luta para salvar o Universo... Era tudo advindo da literatura que sempre abominei: fábulas, heróis, bem e mal, personagens superficiais...
“Esquecimento... Será que essa doideira toda é como aconteceu no filme História Sem Fim, onde o mundo da fantasia estava sumindo porque as pessoas não viviam mais as imaginações nele?”, filosofou Wellington. “E onde está o cão voador?”, repliquei ironicamente. “Mais paciência professor: o que o Wellington disse parece sem sentido, mas pode estar bem próximo do que está acontecendo.”, alertou-me Irina, não tão serenamente. “Se for isso, o que vamos fazer para impedir a destruição dos mundos?”, perguntou Sarah.
Wellington levantou-se do colchão, fez expressão de quem sabe centenas de anos de cultura e discursou: “o mundo da imaginação não é físico, como o nosso. Assim, não segue as leis universais da física. O eixo, a órbita que sustenta esse universo de imaginação parece ser, pelo menos para mim, as mentes das pessoas. Se não lemos, não assistimos filmes, não temos lendas, fábulas, heróis, vilões, terras mágicas em nossa imaginação, o mundo dos sonhos perde a sustentação. Nós devemos, então, reviver a imaginação!”.
Mas como fazer isso em horas, dias? Um mundo sem sonhos não se muda da noite para o dia.
“Não se muda da noite para o dia o mundo sem sonhos, mas o mundo dos sonhos, talvez.” Completou o sábio Wellington. Irina mudou a expressão – de atônita para profundamente triste –, olhou em meus olhos e disse: “no início dessa confusão, eu era a única ligação com a sanidade para o senhor, professor. E, agora, entendo que o senhor é a única ligação de existência para o universo não-físico. Tudo está em sua mente, e o senhor precisa se sacrificar para que os mundos não sumam.”
“Sacrifício? Não sou Jesus para morrer pela não-cultura da humanidade!”, disse, ainda não entendendo o propósito disso tudo. “Nós quatro precisamos nos sacrificar: toda a memória está, de um jeito que eu não entendo, dentro de nossas mentes.”, discursou Sarah. O fato é que, em tese, nosso sacrifício, naquele momento, nos levaria a uma existência não-existente, a fazer parte do mundo dos sonhos. Se morrêssemos ali, nossas memórias viveriam lá e tudo voltaria ao normal.
“Então, que comece o suicídio!”, disse novamente irônico. “Não podemos nos matar, mas precisamos que alguma coisa ou alguém do mundo de lá nos mate.”, respondeu Irina, antecipando nos olhos as dores da morte. Isso era, para mim, o mais absurdo de tudo, desde o céu roxo e o Interbairros II azul. Mas nada mais cabia em leis físicas, razão, religião.
Se for um sonho, morrerei e levantarei às seis para trabalhar. Se for real – o que é real? -, deixarei de existir? O mundo dos sonhos é uma existência ou não? Novamente sentia a embriaguez de um vinho que já não estava mais em meu corpo. A cabeça balançava involuntariamente: será isso o reflexo de uma epifania? Será que os santos assim se sentiam diante de uma revelação? Não: sou pobre, sou comum; Não sou guru, santo ou profeta. Sou um homem maravilhado em meio a mundo que não conheço.
“Quem nos mataria?”, perguntou Sarah. Depois de soluçar pensamentos, sugeri um algoz: “Fausto!”
Fausto, o homem que vendeu a alma a Mefistófeles em troca de dinheiro e poder. Ele mataria se assim fosse vontade do “Mephisto”. Pois era primeiro o ser demoníaco que devíamos procurar.
“Sua idéia é muito arriscada, professor.”, disse Irina, que continuou: “por mais que seja o Mefistófeles de um livro, ele pode se imaginar não do mundo dos sonhos, mas do próprio inferno.” Do inferno? Então céu e inferno não são imaginação?
“Será que vai dar certo?”, perguntou Sarah. Ninguém acreditava que esse plano maluco funcionaria: invocar o diabo e fazê-lo convencer seu “sócio”, Fausto, a nos matar. “E por que precisamos morrer?”, perguntei já saudoso de meu sangue. “Porque assim recuperamos o equilíbrio, como numa balança: o lado mais leve precisa se equiparar com o mais pesado.”, resolveu Wellington.
E lá fomos: “Mefistófeles, Senhor de Fausto, vinde até nós!”, repetindo a ladainha satânica para um ato santo! “Mefistófeles, Senhor de Fausto, vinde até nós!”, até que o céu roxo escureceu-se, como que sem luz nem mesmo da lua ou das estrelas, e apareceu em nossa frente um homem com roupas de gala e fogo nos olhos.
Antes que um de nós pudesse explicar a rogação, Mefistófeles disse: “Eu já sei o que vocês querem. Mas não terão! EU não convencerei Fausto a matá-los! Seu mundo se destruirá, porque EU quis assim! EU sou Imperador do Mundo! Vocês sucumbirão à eternidade do nada, junto com seu mundo de sonhos, porque EU terei prazer em plenitude depois de ver a agonia da destruição de seus lares! EU, Senhor da Trapaça, EU os matarei!”
Uma dor profunda acompanhava o que parecia ser rasgar de ossos nas costelas, além de uma sensação de derretimento do cérebro. Eu, Irina, Wellington e Sarah, agonizando as dores da morte. Era o fim de tudo. Se aquele Mefistófeles fosse um demônio “real”, morreríamos e os dois mundos entrariam em destruição mútua. Mas, se aquele fosse o Mefistófeles do Goethe, o equilíbrio estaria feito e nossas mortes não seriam em vão.
Entre os gritos de desespero e dor, ouvi a voz de Irina, quase num gemido: “perdão, professor! Eu errei!”. Um pedido indevido, já que a idéia frustrada foi minha. Depois de ver os olhos pretos e molhados de Irina se fecharem, caí em escuridão.
Eu já não ouvia mais os gritos. Não sentia o fogo derretendo as entranhas. Um silêncio total, mergulhado em escuridão profunda, num instante onde eu não sabia se era eternidade ou fim do tempo. Eu estava sozinho, sem nada, sem ninguém. Falhamos: eis o fim de tudo.
De repente, de forma violenta, as trevas foram quebradas por um longo assovio e voltei a sentir minhas costelas, que pareciam golpear o nada. O assovio perturbador continuava e, de quando em quando, minhas costelas pulavam do chão como se fossem puxadas por uma força alheia até que o assovio cessou.
“Conseguimos trazê-lo de volta! O coração voltou a bater!”, diziam vozes em volta de mim. Com muito esforço, consegui abrir os olhos: eu estava na cama de um hospital, ligado a aparelhos. “Que susto você nos deu, professor!”, disse um dos médicos. Eu havia passado por um infarto no coração na noite de domingo. Fui salvo por um dos parentes da visita dominical. Eu só veria Irina uma semana depois.
Durante os dias de internamento, ficava pensando se tudo aquilo era sonho. Talvez uma forma que o cérebro arrumou para manter a vida nesse corpo moribundo. Eu ficava esperando a visita de um dos envolvidos nesse sonho, mas: nada.
No quarto dia recebi, então, a visita de minha filha. Ela olhava com felicidade e alívio para meu rosto de barba por fazer. Depois de um longo abraço e um beijo na testa, a menina mirou no meu olhar com seus olhos pretos e, novamente, adivinhou minha indagação: “sim, pai: tudo o que aconteceu foi verdade. Agora não é mais. Agora o mundo dos sonhos segue seu rumo, enquanto nós vivemos no mundo físico. O que aconteceu foi real, mas não é mais porque evitamos aquela catástrofe. Mefistófeles tanto se imaginava senhor dos infernos que acreditava ser real e, por isso, queria que tudo se destruísse. Nós quatro sabemos disso, mais ninguém. Agora, o nosso dever é fazer renascer os sonhos na mente das pessoas.”
Clique para fechar o texto.
Há alguns meses eu postei um conto de minha autoria neste blogue. O "Dia sem fim" foi publicado em onze partes, no estilo folhetim. Decidi reuni-las e publicar o conto completo.
Para quem tiver paciência e curiosidade o suficiente e quiser se aventurar nessa literatura barata, aqui está o "Dia sem fim" no Google Docs:
http://docs.google.com/View?id=dg66df7z_0gz6ghhhg
Ou, se preferir, pode ler o conto dentro do blogue, clicando aqui.
DIA SEM FIM
Autor: Fábio Pedro Racoski
Mais um dia terrível.
Visita de domingo: família, amigos e penetras reunidos em torno de uma maionese ruim. Ao cair da noite, todos se foram dentro do Interbairros II, o verdejante expresso infernal que conduz milhares de almas por dentro de Curitiba. Chutando os chinelos, desfaleci sobre a cama.
Então aconteceu o primeiro pesadelo: o céu estava em chamas. Olhei pela janela do quarto e vi bombas incendiárias destruindo nossas casas de madeira. O napalm cruzava a superfície e impregnava seu mau cheiro pelo ar. Queria sair dali, queria correr para longe, fugir para a Austrália. Não podia mais.
Mas, ei! Não moro em casa de madeira! Não sou um vietnamês prestes a correr do napalm ao lado de Kim Phuc! Não: não era verdade! Levantei e fui até a cozinha para tomar água. Levo um susto mortal: alguém arrombou a porta. Eram dois oficiais da SS nazista; eles me renderam. Estavam me conduzindo até o caminhão, mas, ao passar pela porta, alguma força me prendeu. Os chucrutes ficaram para fora; eu, para dentro, encarcerado por uma parede invisível que me jogava para o interior da casa.
Mais um sonho, só pode ser! Tomei um gole de vinho barato. Mais um. E outro. Apliquei beliscões no braço: nada. Voltei à cama, mas um forte tremor me fez levantar e espiar pela janela: milhares e milhares de cavalos, cavaleiros, lanceiros, todos bradando: “Alerrándros, Alerrándros, Alerrándros!”
Uma flecha atingiu o vidro de onde eu assistia aos macedônios e tudo caiu num clarão ofuscante. Depois que essa luz se apagou, só se via destruição por tudo. Meu Deus! Era Hiroshima! Eu estava viajando por tempos e lugares? Qual a procedência do vinho? O que minha tia pôs naqueles croquetes?
Fechei os olhos e, ao abri-los novamente, não havia mais casa, cama, paredes... Eu via pessoas sendo chicoteadas, estupradas, esquartejadas, escravizadas, roubadas... Um buraco abriu debaixo de mim e eu caí. Caí por horas, minutos... Até que me estatelei contra mim mesmo na cama de minha casa.
Eita, pesadelo! Eram seis da manhã de segunda-feira. Já havia perdido o Interbairros II que me leva ao serviço na hora certa. Atrasado de novo! Saí em disparada, mas o sol brilhava azul numa rua que era outra...
Só podia ser droga, mesmo. Ou, então, uma experiência religiosa... Não: lá vinha o Interbairros II. Mas não era verde: estava azul. Deixando meu daltonismo momentâneo de lado, entrei na condução.
Estranho: o motorista era outro. O cobrador também. Não havia ninguém conhecido no ônibus. Apenas pessoas de cabeça raspada, todas, e roupas alaranjadas. Alguém me cumprimenta: “purifica-te ao Imperador, forasteiro!” Não entendi e nunca entenderei essa saudação. Ao entregar o dinheiro para o cobrador, este me devolve: “nunca vimos estas cédulas por aqui; não são cédulas do Imperador. É um invasor! Atirai-o para fora!” E lá fui eu, voando lentamente para um encontro do meu nariz com o concreto áspero da calçada.
Desmaiei. Quando acordei, estava dentro de casa. Deixei cair o café sustentado em minhas mãos. Vesti o macacão e fui em direção ao meu emprego de metalúrgico. Eram seis da manhã e o sol brilhava vermelho no céu...
Estava atrasado: precisava correr para alcançar o Interbairros II. Consegui! Entrei e... um ônibus lotado como eu nunca tinha visto, repleto de mulheres em túnicas transparentes. Elas cantavam coisas estranhas e me jogavam flores. “Seja bem-vindo, estrangeiro”, disse a mais bela. Quando comecei a gostar desse devaneio (ou não...), uma força me puxa, fazendo cair estatelado na sala de minha casa.
Levantei, vesti meu jaleco e saí em direção à escola onde dou aulas. Eram seis da manhã de segunda-feira e eu estava atrasado para o Interbairros II de sempre. O sol brilhava roxo no céu. Percebi que alguma coisa estava fora do comum: os sonhos pareciam reais; as sensações pareciam sentidas; o Interbairros II parecia um bom ônibus. Resolvi não pegar condução. Liguei para a escola avisando sobre minha falta recém-planejada. Eles nem se importam: hoje (hoje?) era minha permanência. Não veria alunos e alunas.
Resolvi caminhar pelas ruas da vizinhança e, ao dobrar uma esquina, me encontro com uma de minhas alunas, Irina. “Onde você vai, professorzinho?”, indagou-me Irina. Não sabia o que responder. Não sabia se ainda era sonho, pois Irina é uma de minhas alunas mais dedicadas. E bela, ainda que eu a veja como uma filha. “Eu também estou perdida, nem sei se hoje é hoje. É por causa desse sol agora roxo!”
O que Irina disse fez-me palpitar de tal forma que precisei buscar assento no meio-fio. Como ela sabia que eu estava perdido, se nem eu mesmo tinha pensado nisso? Estávamos nós dois nesse turbilhão espaço-temporal-alucinógeno?
Continuamos eu e Irina à frente na calçada destruída pela incrível força das raízes de árvores. Aquele sol brilhando roxo e transformando o céu num bordô-rosê uniforme me causava náuseas. “Calma, professor: quando passar o efeito, você vai ficar bem!”, disse Irina. “Efeito de drogas? Como, se eu não sou drogado?”, indaguei a moça religiosamente.
Enquanto caminhávamos, Irina me explicou que o que causa as náuseas é o sol roxo. Ela afirmava estar sóbria. Quanto a mim: eu já não sabia. Tinha dúvidas de quanto vinho bebi: a cor do céu não me deixava esquecê-lo. Nesse espaço de silêncio para as minhas divagações, um clarão surgiu diante de nós. “Fique calmo, professor”, disse Irina – quem eu deveria conduzir agora me conduz! “É só o Tesla!”
E era mesmo: alguém que poderia passar por sósia de Frank Zappa vestindo roupas de época. Nikola Tesla, inventor do motor trifásico, experimentador da descarga de Tesla e, para alguns, o criador do “raio da morte”. Ali, à minha frente. “Ele está e não está aqui, professor”, educou-me mais uma vez Irina. “Como assim: está e não está? Holografia? Alucinação?”, perguntei, embriagado de informações confusas e improváveis.
Segundo Irina, o que avistávamos então era uma ligação entre espaços, tempos, universos, mundos de imaginação e orgânicos. “Não é um buraco de minhoca”, disse a aluna-mestra antes que eu o terminasse de pensar. “Você viveu essa experiência, de maneira mais intensa, hoje à noite”.
Agora eu estava realmente com medo: “COMO VOCÊ SABE DISSO?” Irina amarrou seus cabelos pretos, deixando revelar ainda mais a face pálida. Olhou-me da maneira mais profunda que alguém me olhou desde que saí da casa de minha mãe e disse, suavemente: “fui eu quem levou o professor a viver aquilo. E por isso você está aqui. Nós precisamos do senhor!”
Quem precisava? E para que um professor de história seria útil num mundo de devaneios? Eu quero acordar...
De um instante para outro, o mundo que aprendi a contar para alunos, amigos e familiares era para mim um desconhecido. Eu me sentia como um bebê ao ver pela primeira vez a luz do sol. Não entendia como fui, ao mesmo tempo, no mesmo instante, secretário e metalúrgico, profissões que nunca ousei exercer. Minha sensação era talvez igual à de uma girafa arrancada de sua savana na África e presa num zoológico em Nova Iorque. Tudo para mim era alienígena. Eu só conseguia identificar-me a mim mesmo através da Irina de pele branquíssima e olhos pretos.
“O senhor é o único que pode arrumar toda essa bagunça, professor”, disse-me Irina com os olhos de ver pai. “Eu? Arrumar? Arrumar o quê?”, o único pensamento frutífero em minha mente. “Arrumar os mundos que se misturaram”. Segundo minha querida aluna (seria eu aluno e ela a professora?), o sol roxo, os devaneios da minha última noite de sono, as viagens inexplicáveis entre mundos de sóis multicolores, isso tudo era resultado do prólogo de uma tragédia: mundos se chocando, uns contra os outros, e acabando com a realidade em cada um para que exista uma só, onde o Imperador governe.
“Não são universos paralelos!”, exclamou Irina, novamente antecipando-se ao meu pensamento. “São mundos diferentes, não-paralelos, não-lineares. Mundos reais e imaginários. Olhe no seu relógio, professor. Já se passaram dezenove horas de segunda-feira e ainda estamos com o sol, ainda que roxo, da manhã. Veja lá, no fim da rua: aquele vestido de casaca azul. É o Werter!”
Werter não é, nem de perto, meu preferido no mundo da imaginação literária. Então: o que ele fazia ali? Como mundos imaginários podem invadir a realidade? Era o vinho, só podia ser. Mas Irina leu meus pensamentos e arrematou: “Há mundos imaginados tão intensamente que ganham força para preencher dimensões físicas, ainda que não sejam as nossas. Quem sabe eu seja um sonho seu, professor. Para mim o senhor é o professor que eu sempre sonhei em ter: afeto de pai, carinho de amigo e porte de mestre”.
Nunca havia me emocionado com declarações de alunos. Os presentes de fim de ano, carro de som, homenagens... Mas o que Irina disse me tocou de verdade, pois seus olhos negros não vestiam a capa da falsidade. Não me surgiam respostas, agradecimentos. Somente uma vontade forte de beijá-la a testa e foi o que fiz.
“Por favor, Irina, me explique: por que esses mundos – um mais insano que o outro - estão se mesclando? Quem é esse Imperador (tivemos vários)? Por que eu e para quê?”
“Você, professor, é mestre, educador, quem prepara a Humanidade para receber conhecimento. É mestre da história, que carrega toda a Humanidade milenar. Por isso você é um escolhido”, disse-me Irina com voz firme. Novamente, eu não tinha palavras.
“Você já se perguntou, professor, se o mundo em que vivemos existe mesmo ou é apenas uma ilusão?”, dirigiu-se a mim Irina, que há pouco me tratava por senhor. Viver num mundo de ilusão: é a crença de Platão, Berkeley, irmãos Wachowski... “Nós não somos reais?”, perguntei. “Sim, professor, somos. Tente imaginar como se sentem Werter, Dom Quixote, Gúliver...”
Dom Quixote? Meu herói da adolescência existe em um desses mundos? “Sim, professor. Há muitas pessoas que viveram intensamente o Quixote. Ele cavalga sobre o Rocinante, ao lado de Sancho Panza, pelo mesmo mundo do Werter.”
“Mas você não me respondeu, Irina: quem é o Imperador e por que diabos mundos se misturam, meu Deus?”, indaguei Irina impacientemente. “A fusão dos mundos só está acontecendo porque o universo dos sonhos – onde vivem Quixote, Rei Artur, Dom Casmurro – perdeu a sustentação de sua órbita.” Perguntei se era o Sol, por acaso. No que a aluna me respondeu: “não exatamente. É todo um universo de pensamentos que está perdendo a luz. Aí é que entra seu papel, professor: descobrir qual a relação do Imperador com o apagar dessa luz.”
Como? Faltou ainda explicar quem é o Imperador. Não faltou mais: “o Imperador, professor, é alguém ou alguma coisa que foi banido do universo dos sonhos e, desde então, planeja sua volta. Agora, com a fusão dos dois mundos, o nome Imperador aparece em sonhos das pessoas escolhidas para essa batalha.”
“Uma batalha? Eu vou ter que pegar em rifles e lutar contra esse carcamano?”, perguntei assustado a Irina. “Não, professor. A batalha é contra a fusão dos mundos: se eles se misturarem de vez, os dois deixarão de existir. Precisamos do Imperador, para saber como podemos impedir essa fusão.”
“E onde eu encontro esse Imperador?”, perguntei já sonolento. “Em seus sonhos, professor. Mas você precisa esperar mais duas pessoas antes de dormir. São dois escolhidos para a batalha: Wellington e Sarah.”
Eu os conheço: Wellington é zelador de uma das escolas onde trabalho. Sarah é balconista em uma padaria perto da minha casa. Eis a situação: um professor de história, fã de música caipira; um zelador que “curte” reggae; e uma balconista adolescente metaleira. Escolhidos ecléticos...
Irina explicou-me: “Wellington gosta de ler, principalmente fábulas heróicas ao estilo Senhor dos Anéis. Sarah é a música e, também, a que tem mais espiritualidade aqui. Espere, professor, que logo vocês vão encontrar o Imperador.”
Eu já não me embriagava mais de informações, ainda que o clima parecesse muito psicodélico para alguém que não consumiu LSD. Enquanto esperava para dormir – vejam só! –, cantarolava melodias das canções de minha infância. “Ando devagar porque já tive pressa e levo esse sorriso porque já chorei demais...” Eis que Irina, tão jovem, continuou a canção junto a mim. E lá fomos nós, cantarolando músicas de Almir Sater, Tião Carreiro, Silvio Britto, Pena Branca e Xavantinho... Músicas: formavam meu elo com a “realidade” que eu um dia vivi.
Depois de eu e Irina passarmos por todo o repertório violeiro, chegando até mesmo a Mercedes Sosa, Atahualpa Yupanqui e Joan Manuel Serrat, chegam enfim os dois “escolhidos”. “Vocês não se sentem num manicômio?”, perguntei. “Não: esse mundo maluco é muito melhor que o mundo da minha infância com pai bêbado que batia em mim.”, respondeu Wellington que, sim, teve uma vida de muitos obstáculos. Sarah, sempre lacônica, resumiu-se num simples “é estranho”.
“É hora de começar o sono.”, conclamou-nos Irina. Não haveria de ser em plena calçada. “Vamos para minha casa, que ainda existe, eu acho.”, disse Wellington.
E lá fomos. Uma casa simples, pequena, porém muito rica em detalhes e cuidados. Acabamos nos estendendo em colchões e sofá. “E agora?”, perguntou Sarah. “Durmam, simplesmente. A gente se encontra lá nos sonhos.”, finalizou Irina. Todos os quatro estávamos muito ansiosos e entupidos de medo: seria difícil dormir assim. Mas, do nada, um sono se abateu sobre nós, como se fosse um veneno, uma droga, um medicamento. A luta para fechar os olhos passou a ser uma batalha para deixá-los abertos. Batalha à qual todos se renderam.
Mais uma vez, um sonho estranho: eu só avistava uma neblina púrpura muito densa por todos os lados, e ouvia a voz de uma criança cantarolando qualquer canção. Chamava pela Irina e não tinha resposta. “Wellington? Sarah?”, nada... O que existia: a voz da criança a cantar e a neblina púrpura. Mais nada. E a voz da criança cada vez mais próxima. “Tolle lege””, ela cantava num latim macarrônico. “Tolle lege, tolle lege.”, tomar e ler o quê? Lembrei: esse é o canto que Agostinho ouviu e acabou levando-o a converter-se cristão. “Sonhos! Poupem-me de experiências religiosas agora, por favor!”, respondi encarando a neblina. Eis a réplica recebida: “tolle lege, tolle lege”. Essa repetição preenchendo o nada em minha volta parecia me deixar embriagado novamente. A Irina disse: “A gente se encontra lá nos sonhos.”, mas aonde estão todos? Nunca acreditei em poder de sonhos, mágica, universos paralelos, religião. Por que haveria de crê-los agora? Era mais um sonho, só isso. Tudo isso deve ser sonho, mesmo, e amanhã, segunda-feira, eu levantarei às seis para trabalhar.
Uma voz diferente, firme e já rouca do tempo, interrompe o sonho insólito: “Não negue a si mesmo, filho!”. Pai? Meu falecido pai? O vinho era forte... “Não se negue ao que você realmente crê!”, repetia meu pai. “Você está morto, pai.”, respondi. “Mas ainda vivo, em você, em outro lugar.”, replicou a voz de meu progenitor. E passei a divagar, pensar sobre mim mesmo. Por viver o modismo particular de ser cético, deixei de experimentar sentimentos comuns até mesmo para céticos, como o amor, a paixão, a compaixão. Talvez aquele sonho fosse uma prova à minha farsa. Talvez todos esses fenômenos bizarros tenham sentido fora do meu falso ceticismo.
A neblina púrpura se desfez. A voz da criança calou-se e pude ver, à minha frente, os “escolhidos”, Irina, Sarah, Wellington.
Agora estávamos reunidos em sonho! Será? Ainda desconfiava da realidade e dos sonhos. Ainda era forte em mim a sensação de que acordaria às seis da manhã de segunda-feira para trabalhar, apesar de tudo.
“Aqui vamos encontrar a resposta.”, disse Irina, obviamente falando sobre imperadores impossíveis. O cenário vazio do sonho-reunião foi preenchido subitamente por enormes edifícios: todos da mesma forma e apresentando a mesma cor de ferro e vidro. Sarah abriu um sorriso, esticou o dedo indicador para um entre os inúmeros prédios e disse: “Lá!” A sensibilidade da moça nos conduzindo?
E para aquela direção fomos. E eu que pensava serem os sonhos lugares onde não há limitações físicas! Caminhamos, caminhamos, até chegar à porta de entrada da torre igual. Tudo parecia muito real para um sonho, pensei. E Irina leu meus pensamentos novamente: “não é um sonho. É realidade. Estamos na outra parte, no mundo da imaginação. Dormir era uma forma de virmos para cá. Numa situação normal, seria um sonho. Mas nessa mistura de mundos, não.”
Realmente. Percebi isso porque nesse instante ocorreu uma situação inusitada: um escaravelho gigante passando por nós como se estivesse nos cumprimentando. “É o Gregor Samsa! É como eu o imagino!”, exclamou admirado Wellington.
Entramos no edifício. E eis um fato estranho. Um saguão de entrada como que futurista, acompanhando a arquitetura do prédio: funcional, monocromática, sem adornos, sem arte, sem humanidade. Uma frase em latim quebrava a monotonia do lugar: “OBLIVIO IMPERATOR MUNDI”.
Tudo sumiu. O que vi diante de mim foi o braço do sofá. Acordei. Acordamos. Mais um sonho dentro do pesadelo pelo qual passávamos. “Vocês estavam lá? Viram o escaravelho, a frase em latim?”, perguntou Sarah. A resposta afirmativa de todos foi um atônito balançar de cabeça. “Alguém entende latim?”, perguntei, já descrente de uma afirmação. Para minha surpresa, Sarah alegou conhecer a língua. “Fortuna Imperatrix Mundi significa Sorte (fortuna) imperatriz do mundo. Oblivio Imperator Mundi quer dizer ‘Esquecimento Imperador do Mundo’”.
“Hã? O Imperador é o esquecimento? A falta de memória? Isso não tem sentido!”, afirmei impaciente. “Mas eu disse que esse Imperador poderia ser alguma coisa e não alguém.”, replicou serenamente Irina. O imperador a quem devemos derrotar é o esquecimento. De quê? A falta de memória do povo: seria isso? É o que nós quatro discutíamos. Eu já não tinha mais paciência: esquecimento, sonhos, luta para salvar o Universo... Era tudo advindo da literatura que sempre abominei: fábulas, heróis, bem e mal, personagens superficiais...
“Esquecimento... Será que essa doideira toda é como aconteceu no filme História Sem Fim, onde o mundo da fantasia estava sumindo porque as pessoas não viviam mais as imaginações nele?”, filosofou Wellington. “E onde está o cão voador?”, repliquei ironicamente. “Mais paciência professor: o que o Wellington disse parece sem sentido, mas pode estar bem próximo do que está acontecendo.”, alertou-me Irina, não tão serenamente. “Se for isso, o que vamos fazer para impedir a destruição dos mundos?”, perguntou Sarah.
Wellington levantou-se do colchão, fez expressão de quem sabe centenas de anos de cultura e discursou: “o mundo da imaginação não é físico, como o nosso. Assim, não segue as leis universais da física. O eixo, a órbita que sustenta esse universo de imaginação parece ser, pelo menos para mim, as mentes das pessoas. Se não lemos, não assistimos filmes, não temos lendas, fábulas, heróis, vilões, terras mágicas em nossa imaginação, o mundo dos sonhos perde a sustentação. Nós devemos, então, reviver a imaginação!”.
Mas como fazer isso em horas, dias? Um mundo sem sonhos não se muda da noite para o dia.
“Não se muda da noite para o dia o mundo sem sonhos, mas o mundo dos sonhos, talvez.” Completou o sábio Wellington. Irina mudou a expressão – de atônita para profundamente triste –, olhou em meus olhos e disse: “no início dessa confusão, eu era a única ligação com a sanidade para o senhor, professor. E, agora, entendo que o senhor é a única ligação de existência para o universo não-físico. Tudo está em sua mente, e o senhor precisa se sacrificar para que os mundos não sumam.”
“Sacrifício? Não sou Jesus para morrer pela não-cultura da humanidade!”, disse, ainda não entendendo o propósito disso tudo. “Nós quatro precisamos nos sacrificar: toda a memória está, de um jeito que eu não entendo, dentro de nossas mentes.”, discursou Sarah. O fato é que, em tese, nosso sacrifício, naquele momento, nos levaria a uma existência não-existente, a fazer parte do mundo dos sonhos. Se morrêssemos ali, nossas memórias viveriam lá e tudo voltaria ao normal.
“Então, que comece o suicídio!”, disse novamente irônico. “Não podemos nos matar, mas precisamos que alguma coisa ou alguém do mundo de lá nos mate.”, respondeu Irina, antecipando nos olhos as dores da morte. Isso era, para mim, o mais absurdo de tudo, desde o céu roxo e o Interbairros II azul. Mas nada mais cabia em leis físicas, razão, religião.
Se for um sonho, morrerei e levantarei às seis para trabalhar. Se for real – o que é real? -, deixarei de existir? O mundo dos sonhos é uma existência ou não? Novamente sentia a embriaguez de um vinho que já não estava mais em meu corpo. A cabeça balançava involuntariamente: será isso o reflexo de uma epifania? Será que os santos assim se sentiam diante de uma revelação? Não: sou pobre, sou comum; Não sou guru, santo ou profeta. Sou um homem maravilhado em meio a mundo que não conheço.
“Quem nos mataria?”, perguntou Sarah. Depois de soluçar pensamentos, sugeri um algoz: “Fausto!”
Fausto, o homem que vendeu a alma a Mefistófeles em troca de dinheiro e poder. Ele mataria se assim fosse vontade do “Mephisto”. Pois era primeiro o ser demoníaco que devíamos procurar.
“Sua idéia é muito arriscada, professor.”, disse Irina, que continuou: “por mais que seja o Mefistófeles de um livro, ele pode se imaginar não do mundo dos sonhos, mas do próprio inferno.” Do inferno? Então céu e inferno não são imaginação?
“Será que vai dar certo?”, perguntou Sarah. Ninguém acreditava que esse plano maluco funcionaria: invocar o diabo e fazê-lo convencer seu “sócio”, Fausto, a nos matar. “E por que precisamos morrer?”, perguntei já saudoso de meu sangue. “Porque assim recuperamos o equilíbrio, como numa balança: o lado mais leve precisa se equiparar com o mais pesado.”, resolveu Wellington.
E lá fomos: “Mefistófeles, Senhor de Fausto, vinde até nós!”, repetindo a ladainha satânica para um ato santo! “Mefistófeles, Senhor de Fausto, vinde até nós!”, até que o céu roxo escureceu-se, como que sem luz nem mesmo da lua ou das estrelas, e apareceu em nossa frente um homem com roupas de gala e fogo nos olhos.
Antes que um de nós pudesse explicar a rogação, Mefistófeles disse: “Eu já sei o que vocês querem. Mas não terão! EU não convencerei Fausto a matá-los! Seu mundo se destruirá, porque EU quis assim! EU sou Imperador do Mundo! Vocês sucumbirão à eternidade do nada, junto com seu mundo de sonhos, porque EU terei prazer em plenitude depois de ver a agonia da destruição de seus lares! EU, Senhor da Trapaça, EU os matarei!”
Uma dor profunda acompanhava o que parecia ser rasgar de ossos nas costelas, além de uma sensação de derretimento do cérebro. Eu, Irina, Wellington e Sarah, agonizando as dores da morte. Era o fim de tudo. Se aquele Mefistófeles fosse um demônio “real”, morreríamos e os dois mundos entrariam em destruição mútua. Mas, se aquele fosse o Mefistófeles do Goethe, o equilíbrio estaria feito e nossas mortes não seriam em vão.
Entre os gritos de desespero e dor, ouvi a voz de Irina, quase num gemido: “perdão, professor! Eu errei!”. Um pedido indevido, já que a idéia frustrada foi minha. Depois de ver os olhos pretos e molhados de Irina se fecharem, caí em escuridão.
Eu já não ouvia mais os gritos. Não sentia o fogo derretendo as entranhas. Um silêncio total, mergulhado em escuridão profunda, num instante onde eu não sabia se era eternidade ou fim do tempo. Eu estava sozinho, sem nada, sem ninguém. Falhamos: eis o fim de tudo.
De repente, de forma violenta, as trevas foram quebradas por um longo assovio e voltei a sentir minhas costelas, que pareciam golpear o nada. O assovio perturbador continuava e, de quando em quando, minhas costelas pulavam do chão como se fossem puxadas por uma força alheia até que o assovio cessou.
“Conseguimos trazê-lo de volta! O coração voltou a bater!”, diziam vozes em volta de mim. Com muito esforço, consegui abrir os olhos: eu estava na cama de um hospital, ligado a aparelhos. “Que susto você nos deu, professor!”, disse um dos médicos. Eu havia passado por um infarto no coração na noite de domingo. Fui salvo por um dos parentes da visita dominical. Eu só veria Irina uma semana depois.
Durante os dias de internamento, ficava pensando se tudo aquilo era sonho. Talvez uma forma que o cérebro arrumou para manter a vida nesse corpo moribundo. Eu ficava esperando a visita de um dos envolvidos nesse sonho, mas: nada.
No quarto dia recebi, então, a visita de minha filha. Ela olhava com felicidade e alívio para meu rosto de barba por fazer. Depois de um longo abraço e um beijo na testa, a menina mirou no meu olhar com seus olhos pretos e, novamente, adivinhou minha indagação: “sim, pai: tudo o que aconteceu foi verdade. Agora não é mais. Agora o mundo dos sonhos segue seu rumo, enquanto nós vivemos no mundo físico. O que aconteceu foi real, mas não é mais porque evitamos aquela catástrofe. Mefistófeles tanto se imaginava senhor dos infernos que acreditava ser real e, por isso, queria que tudo se destruísse. Nós quatro sabemos disso, mais ninguém. Agora, o nosso dever é fazer renascer os sonhos na mente das pessoas.”
Clique para fechar o texto.
quarta-feira, 26 de agosto de 2009
Filtro solar...
Ótima paródia do Rafinha Bastos àquela mensagem de fim de ano do Pedro Bial que, por sua vez, é uma versão de outra mensagem piegas em inglês (Sunscreen).
AVISO: este vídeo contém palavrões.
AVISO: este vídeo contém palavrões.
terça-feira, 25 de agosto de 2009
Bella Ciao Brasiliana
Sou comunista
capitalista.
O Bella Ciao, Bella Ciao, Bella Ciao Ciao Ciao.
Sou anarquista
e direitista
E de velhice hei de morrer.
De manhãzinha o sol brilhava.
O Bella Ciao, Bella Ciao, Bella Ciao Ciao Ciao.
E eu podia estar na praia
mas hoje é dia de votação.
Se eu ganho lucro
burro e pelado...
O Bella Ciao, Bella Ciao, Bella Ciao Ciao Ciao.
Se eu ganho lucro
burro e pelado
pra que cultura e educação?
Eu sou guerreiro,
sou partigiano.
O Bella Ciao, Bella Ciao, Bella Ciao Ciao Ciao.
Eu sou guerreiro,
sou partigiano
quando o assunto é futebol.
E se me roubam
lá no Congresso...
O Bella Ciao, Bella Ciao, Bella Ciao Ciao Ciao.
E se me roubam
lá no Congreso
eu também quero mensalão.
Novo conceito
sociopolítico.
O Bella Ciao, Bella Ciao, Bella Ciao Ciao Ciao.
Novo conceito
sociopolítico:
é o "deixadismo" do povo meu.
Novo conceito
sociopolítico:
é o "deixadismo" do povo meu.
--> O que é Bella Ciao?
--> Várias interpretações da canção "Bella Ciao".
capitalista.
O Bella Ciao, Bella Ciao, Bella Ciao Ciao Ciao.
Sou anarquista
e direitista
E de velhice hei de morrer.
De manhãzinha o sol brilhava.
O Bella Ciao, Bella Ciao, Bella Ciao Ciao Ciao.
E eu podia estar na praia
mas hoje é dia de votação.
Se eu ganho lucro
burro e pelado...
O Bella Ciao, Bella Ciao, Bella Ciao Ciao Ciao.
Se eu ganho lucro
burro e pelado
pra que cultura e educação?
Eu sou guerreiro,
sou partigiano.
O Bella Ciao, Bella Ciao, Bella Ciao Ciao Ciao.
Eu sou guerreiro,
sou partigiano
quando o assunto é futebol.
E se me roubam
lá no Congresso...
O Bella Ciao, Bella Ciao, Bella Ciao Ciao Ciao.
E se me roubam
lá no Congreso
eu também quero mensalão.
Novo conceito
sociopolítico.
O Bella Ciao, Bella Ciao, Bella Ciao Ciao Ciao.
Novo conceito
sociopolítico:
é o "deixadismo" do povo meu.
Novo conceito
sociopolítico:
é o "deixadismo" do povo meu.
Fábio Pedro Racoski
--> O que é Bella Ciao?
--> Várias interpretações da canção "Bella Ciao".
O nosso poeta
Paulo Leminski
me chegou pela escola,
na forma de nome de pedreira.
Maldita escola
que me injetava ignorância
sob a pele de conhecimento.
Maldita escola
que me negava os haicais,
os versos livres,
o Catatau do Kamiquase.
A mesma escola que me ensinava:
"esse Paulo escreve tudo errado,
tudo torto."
E tarde é que descobri:
os poetas são como Deus.
Escrevem certo
por linhas tortas.
São sóbrios
na embriaguez.
São sensatos
na loucura.
me chegou pela escola,
na forma de nome de pedreira.
Maldita escola
que me injetava ignorância
sob a pele de conhecimento.
Maldita escola
que me negava os haicais,
os versos livres,
o Catatau do Kamiquase.
A mesma escola que me ensinava:
"esse Paulo escreve tudo errado,
tudo torto."
E tarde é que descobri:
os poetas são como Deus.
Escrevem certo
por linhas tortas.
São sóbrios
na embriaguez.
São sensatos
na loucura.
Fábio Pedro Racoski
quinta-feira, 20 de agosto de 2009
Alunos...
quarta-feira, 19 de agosto de 2009
Vossa o quê?
Vossa excelência
roubou minha inteligênica.
Vossa excelência
roubou minha saúde.
Vossa excelência
roubou meu futuro,
estuprou meu presente
e cuspiu no meu passado.
Oh, Vossa excelênia!
A excrescência de
sua alma
contaminou
o rio da minha vida!
roubou minha inteligênica.
Vossa excelência
roubou minha saúde.
Vossa excelência
roubou meu futuro,
estuprou meu presente
e cuspiu no meu passado.
Oh, Vossa excelênia!
A excrescência de
sua alma
contaminou
o rio da minha vida!
Fábio Pedro Racoski
domingo, 16 de agosto de 2009
Reis das Arábias
Rei Abdullah II e sua esposa, Rainha Rania Al-Abdullah, monarcas da Jordânia. Foto encontrada no Twitpic da rainha (http://twitpic.com/e4qba). As arábias como você nunca viu, seu ignorante preconceituoso: esperava turbante e burca??? (Calma, gente: é só pra provocar. Incluo-me aí!)
Twitter dagostosa bela rainha: twitter.com/QueenRania
Que Allah me entenda!
Twitter da
Que Allah me entenda!
quinta-feira, 13 de agosto de 2009
Ele já não cantava mais.
Não fazia versos.
Não falava sobre
história e
filosofia de botequim.
Ele já não xingava
nem chorava
nem beijava.
Ele já não protestava
nem apoiava.
Ele já andava torto,
bêbado na sobriedade
chata do tédio.
Ele já não era mais
humano,
senão um autômato
triste a apertar
parafusos.
Mas eis que ele encontou
um Dostoiévski
empoeirado
no canto do quarto.
A panaceia
de que precisava.
O presente
de Esculápio
para salvar-lhe
a vida.
Não fazia versos.
Não falava sobre
história e
filosofia de botequim.
Ele já não xingava
nem chorava
nem beijava.
Ele já não protestava
nem apoiava.
Ele já andava torto,
bêbado na sobriedade
chata do tédio.
Ele já não era mais
humano,
senão um autômato
triste a apertar
parafusos.
Mas eis que ele encontou
um Dostoiévski
empoeirado
no canto do quarto.
A panaceia
de que precisava.
O presente
de Esculápio
para salvar-lhe
a vida.
Fábio Pedro Racoski
quarta-feira, 12 de agosto de 2009
Top 9 - belos hinos
Depois de postar os cinco hinos mais assustadores, faço este Top 9 (sim, nove!) com os hinos que mais gosto. Sugestão do Igor Ravasco!
Deixarei o hino nacional brasileiro de fora, e abordarei somente ele num post futuro. Então, vamos aos nove mais belos, segundo meus gostos:
9 - ʻE ʻotua māfimafi - hino nacional de Tonga
Não é DA tonga: é DE Tonga. Um país formado por ilhas no meio do Pacífico Sul, não muito próximo da Nova Zelândia. Hino com "a cara" dos povos do Pacífico. Lembra-me as músicas havaianas, as canções do Taiti, Rapa Nui... um hino peculiar!
8 - Kimi ga yo - hino nacional do Japão
Sim: ele estava no Top 5 de hinos assustadores, mas é um dos mais belos e menos "europeizados" (não é marcha, nem ópera). Como havia postado sua versão clássica no Top 5, aqui pus uma versão "a capella".
7 - Hatikva (A Esperança) - hino nacional de Israel
Enquanto no fundo do coração
Palpitar uma alma judaica,
E em direção ao Oriente
O olhar voltar-se a Sião,
Nossa esperança ainda não estará perdida,
Esperança de dois mil anos:
De ser um povo livre em nossa terra,
A terra de Sião e Jerusalém.
Sim: o hino de Israel. Nação polêmica, cuja própria existência divide opiniões até hoje. Mas uma bela canção, mesmo que a letra tenha um tom deveras sionista!
6 - Gosudarstvenny Gimn Rossiyskoy Federatsii (Hino da Federação Russa) - Rússia
Rússia é o nosso Estado sagrado!
Rússia é o nosso amado País!
Vontade de ferro e glória grande
Pertencem-te agora e para todo o sempre.
(Refrão)
Gloriosa a nossa Pátria livre,
Povos irmãos, união secular,
Sabedoria que nos é dada pelos antepassados.
Gloriosa, oh Pátria, de ti nos orgulhamos!
Dos mares do Sul ao círculo Ártico
As nossas florestas e campos abrem-se para ti.
No mundo és única, és sem igual,
Oh, minha terra natal, protegida por Deus!
Amar-te-emos eternamente
(Refrão)
As vastas larguras dos sonhos e vida
Os anos vindouros prometem a nós.
A nossa força vem da fé na Pátria.
Assim foi, assim é, e sempre será!
(Refrão)
A melodia é a mesma que serviu como hino da extinta União Soviética. Apenas mudaram a letra. É um hino que eu gosto de ouvir desde criança (isso que eu nunca fui comunista!).
5 - Deşteaptă-te, române! (Desperta, romeno!) - hino nacional da Romênia
Sim: outro que estava na lista dos assustadores! Mas belo. E, para provar que ele pode ser menos assustador (ou mais, depende do gosto), coloco esta versão, digamos, "roots"!
4 - A portuguesa - hino nacional de Portugal
Ainda que seja "inspirado" no hino da França "A Marselhesa", é meu hino da Europa Ocidental preferido. O fato de entender a letra que se canta também ajuda: são versos que chamam a "galera pro pau", mesmo, pra defender Portugal, agir por Portugal. Hino, mesmo. Com uma bela interpretação vocal: http://www.youtube.com/watch?v=mXooecaVXPY
3 - Ons Hémécht - Hino de Luxemburgo
Não: não é o país do Wanderley! Luxemburgo é uma nação minúscula, que fica entre a Bélgica,a Holanda (Holanda não!), a França e a Alemanha. Gosto dessa melodia: da cadência, dos arranjos, e do tom. Fico devendo a tradução da letra.
2 - Hino nacional da África do Sul
Deus abençoe a África
Que suas glórias sejam exaltadas
Ouça nossas preçes
Deus nos abençoe, porque somos seus filhos
Deus, cuide de nossa nação
Acabe com nossos conflitos
Nos proteja, e proteja nossa nação
À África do Sul, nação África do Sul
Dos nossos céus azuis
Das profundezas dos nossos mares
Sobre as grandes montanhas
Onde os sons se ecoem
Soa o chamado para nos unirmos
e juntos nos fortalecermos
Vamos viver e lutar por liberdade
Na África da Sul a nossa terra.
O hino possui versos em xhosa, zulu, sesotho, africâner e inglês. Combina melodia e versos do hino nacional à época do Apartheid, "Die Stem van Suid-Afrika", com a canção adotada como hino popular de vários países e organizações africanos: "Nkosi Sikelel' iAfrika" (que serve de base para outros hinos nacionais africanos). É o hino mais "nacional", propriamente dito. E uma bela canção, um hino que convida ao respeito pela diversidade, ainda que aconteça hoje, naquele país, uma espécie de Apartheid às avessas: agora o branco é segregado.
E o primeiríssimo:
1 - Intermeco (Intermezzo) - hino nacional da Bósnia e Herzegovina
Belíssimo hino. Adoro essa melodia, vibrante, envolvente. É uma composição clássica de primeira qualidade. Pena eu não ter conseguido uma tradução da letra, ainda que a versão oficial seja apenas instrumental.
Deixarei o hino nacional brasileiro de fora, e abordarei somente ele num post futuro. Então, vamos aos nove mais belos, segundo meus gostos:
9 - ʻE ʻotua māfimafi - hino nacional de Tonga
Não é DA tonga: é DE Tonga. Um país formado por ilhas no meio do Pacífico Sul, não muito próximo da Nova Zelândia. Hino com "a cara" dos povos do Pacífico. Lembra-me as músicas havaianas, as canções do Taiti, Rapa Nui... um hino peculiar!
8 - Kimi ga yo - hino nacional do Japão
Sim: ele estava no Top 5 de hinos assustadores, mas é um dos mais belos e menos "europeizados" (não é marcha, nem ópera). Como havia postado sua versão clássica no Top 5, aqui pus uma versão "a capella".
7 - Hatikva (A Esperança) - hino nacional de Israel
Enquanto no fundo do coração
Palpitar uma alma judaica,
E em direção ao Oriente
O olhar voltar-se a Sião,
Nossa esperança ainda não estará perdida,
Esperança de dois mil anos:
De ser um povo livre em nossa terra,
A terra de Sião e Jerusalém.
Sim: o hino de Israel. Nação polêmica, cuja própria existência divide opiniões até hoje. Mas uma bela canção, mesmo que a letra tenha um tom deveras sionista!
6 - Gosudarstvenny Gimn Rossiyskoy Federatsii (Hino da Federação Russa) - Rússia
Rússia é o nosso Estado sagrado!
Rússia é o nosso amado País!
Vontade de ferro e glória grande
Pertencem-te agora e para todo o sempre.
(Refrão)
Gloriosa a nossa Pátria livre,
Povos irmãos, união secular,
Sabedoria que nos é dada pelos antepassados.
Gloriosa, oh Pátria, de ti nos orgulhamos!
Dos mares do Sul ao círculo Ártico
As nossas florestas e campos abrem-se para ti.
No mundo és única, és sem igual,
Oh, minha terra natal, protegida por Deus!
Amar-te-emos eternamente
(Refrão)
As vastas larguras dos sonhos e vida
Os anos vindouros prometem a nós.
A nossa força vem da fé na Pátria.
Assim foi, assim é, e sempre será!
(Refrão)
A melodia é a mesma que serviu como hino da extinta União Soviética. Apenas mudaram a letra. É um hino que eu gosto de ouvir desde criança (isso que eu nunca fui comunista!).
5 - Deşteaptă-te, române! (Desperta, romeno!) - hino nacional da Romênia
Sim: outro que estava na lista dos assustadores! Mas belo. E, para provar que ele pode ser menos assustador (ou mais, depende do gosto), coloco esta versão, digamos, "roots"!
4 - A portuguesa - hino nacional de Portugal
Ainda que seja "inspirado" no hino da França "A Marselhesa", é meu hino da Europa Ocidental preferido. O fato de entender a letra que se canta também ajuda: são versos que chamam a "galera pro pau", mesmo, pra defender Portugal, agir por Portugal. Hino, mesmo. Com uma bela interpretação vocal: http://www.youtube.com/watch?v=mXooecaVXPY
3 - Ons Hémécht - Hino de Luxemburgo
Não: não é o país do Wanderley! Luxemburgo é uma nação minúscula, que fica entre a Bélgica,
2 - Hino nacional da África do Sul
Deus abençoe a África
Que suas glórias sejam exaltadas
Ouça nossas preçes
Deus nos abençoe, porque somos seus filhos
Deus, cuide de nossa nação
Acabe com nossos conflitos
Nos proteja, e proteja nossa nação
À África do Sul, nação África do Sul
Dos nossos céus azuis
Das profundezas dos nossos mares
Sobre as grandes montanhas
Onde os sons se ecoem
Soa o chamado para nos unirmos
e juntos nos fortalecermos
Vamos viver e lutar por liberdade
Na África da Sul a nossa terra.
O hino possui versos em xhosa, zulu, sesotho, africâner e inglês. Combina melodia e versos do hino nacional à época do Apartheid, "Die Stem van Suid-Afrika", com a canção adotada como hino popular de vários países e organizações africanos: "Nkosi Sikelel' iAfrika" (que serve de base para outros hinos nacionais africanos). É o hino mais "nacional", propriamente dito. E uma bela canção, um hino que convida ao respeito pela diversidade, ainda que aconteça hoje, naquele país, uma espécie de Apartheid às avessas: agora o branco é segregado.
E o primeiríssimo:
1 - Intermeco (Intermezzo) - hino nacional da Bósnia e Herzegovina
Belíssimo hino. Adoro essa melodia, vibrante, envolvente. É uma composição clássica de primeira qualidade. Pena eu não ter conseguido uma tradução da letra, ainda que a versão oficial seja apenas instrumental.
Fonte de pesquisa (letras, nomes de hinos):
pt.wikipedia.org/wiki/Categoria:Hinos_nacionais
pt.wikipedia.org/wiki/Categoria:Hinos_nacionais
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